Lei de Crimes Ambientais e seu papel na proteção ambiental

A Lei de Crimes Ambientais do Brasil, também conhecida como lei nº 9605, foi homologada no mandato do então presidente Fernando Henrique Cardoso, no dia 12 de fevereiro de 1998. 

A criação e validação da Lei de Crimes Ambientais foi um marco, em termos de direito ambiental. Isso porque condutas prejudiciais ao meio ambiente, que antes eram encaradas pela justiça como contravenções (infrações mais leves), passaram a ser consideradas crimes ambientais.

De acordo com a legislação, a Lei de Crimes Ambientais dispõe sobre diferentes ações (ou omissões) que agridem o meio ambiente. Esses atos estão divididos em cinco tipos principais de crimes ambientais e são passíveis de multa, indenização, reparação de danos e até prisão. 

Além disso, a Lei de Crimes Ambientais é válida para pessoas físicas ou jurídicas, o que significa que empresas também podem ser responsabilizadas por atitudes criminosas contra a natureza

Por outro lado, existem pessoas e organizações que desafiam a Lei, praticando atividades ilícitas de degradação ambiental. Alguns exemplos envolvem casos bem divulgados como as queimadas no Pantanal, o garimpo ilegal em terras protegidas, o tráfico de animais silvestres, ou ainda, tragédias desproporcionais, como o rompimento das barragens de mineração em Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais.

Brumadinho, MG, 2019 / Foto de Vinícius Mendonça/Ibamagov, sob CC BY-SA 2.0 DEED no Flickr
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O que diz a Lei de Crimes Ambientais?

A Lei de Crimes Ambientais condena todo e qualquer ato que agrida a natureza, causando danos e prejuízos ao meio ambiente, incluindo fauna, flora e seus recursos naturais, às pessoas e até ao patrimônio cultural.

A Lei prevê sanções penais de acordo com a classificação abaixo:

  • Crimes contra a fauna
  • Crimes contra a flora
  • Poluição e outros crimes ambientais
  • Crimes contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural
  • Crimes contra a Administração Ambiental

No decorrer dos artigos, a Lei de Crimes Ambientais frisa que, em determinados casos, existem permissões, licenças ou autorizações, dadas pelos órgãos competentes, para que haja algum tipo de intervenção no meio ambiente. Na ausência da documentação apropriada, ou no caso da ação não estar de acordo com o que foi autorizado, os atos descritos a seguir configuram crime ambiental.   

Quais são os 5 tipos de crimes ambientais?

Crimes contra a fauna

Descritos desde o artigo 29 até o artigo 37, são considerados crimes contra a fauna:

  • Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória;
  • Impedir a procriação da fauna;
  • Modificar, danificar ou destruir ninho, abrigo ou criadouro natural;
  • Estar em posse de ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, ou ainda produtos e objetos de origem desses animais;
  • Exportar peles e couros de anfíbios e répteis em bruto;
  • Introduzir espécime animal no País, sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida por autoridade competente;
  • Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos;
  • Realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos;
Arara-vermelha no Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) / Foto de Ibamagov, sob CC BY-SA 2.0 DEED no Flickr
  • Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas brasileiras;
  • Causar degradação em viveiros, açudes ou estações de aquicultura de domínio público;
  • Explorar campos naturais de invertebrados aquáticos e algas;
  • Ancorar embarcações ou lançar detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais;
  • Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados;
  • Pescar espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos, quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
  • Transportar, comercializar, beneficiar ou industrializar espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas;
  • Pescar mediante a utilização de explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante ou substâncias tóxicas, ou outro meio proibido.
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Crimes contra a flora

A partir do artigo 38 até o 53, são considerados crimes contra a flora:

  • Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la infringindo as normas de proteção;
  • Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente;
  • Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e nas áreas circundantes das Unidades de Conservação, num raio de dez quilômetros;
  • Provocar incêndio em mata ou floresta;
  • Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano;
  • Extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente: pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais;
  • Cortar ou transformar em carvão madeira de lei, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não;
  • Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final da transação;
  • Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação;
  • Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia;
  • Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues;
  • Comercializar motosserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de vegetação;
  • Penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais.

Poluição e outros Crimes Ambientais

Do artigo 54 até o artigo 61, são também considerados crimes ambientais:

  • Causar poluição de qualquer natureza em níveis que causem ou possam causar danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora;
  • Tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
  • Causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
  • Causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água;
  • Dificultar ou impedir o uso público das praias;
  • Causar (poluição) por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas;
  • Deixar de adotar medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível;
  • Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem autorização ou em desacordo com a obtida;
  • Deixar de recuperar a área pesquisada ou explorada;
Vazamento de petróleo no litoral do nordeste brasileiro, 2019 / Foto de Joyca Farias, sob CC BY 2.0 DEED no Wikimedia Commons
  • Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com a lei;
  • Abandonar os produtos ou substâncias referidos no item anterior, ou os utilizar em desacordo com as normas de segurança;
  • Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização, ou contrariando as normas legais e regulamentares;
  • Disseminar doenças ou pragas ou espécies que possam causar danos à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas.

Crimes contra o Ordenamento Urbano e o patrimônio Cultural

Dando sequência, entre os artigos 62 e 65, os crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural consideram bens ou locais protegidos por lei, ato administrativo ou decisão judicial. É considerado crime:

  • Destruir, inutilizar ou deteriorar qualquer bem, arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar;
  • Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local, com valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental;
  • Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental;
  • Pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano.

Crimes contra a Administração Ambiental

Do artigo 66 até o artigo 69, são considerados crimes contra a administração ambiental:

  • Fazer o funcionário público afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar informações ou dados técnico em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental;
  • Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público;
  • Deixar de cumprir sua obrigação, em questões ambiental, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo;
  • Obstar ou dificultar a fiscalização de questões ambientais pelo Poder Público.

De todos os biomas brasileiros, que sofrem com os impactos danosos de ações humanas contra o meio ambiente, a Amazônia recebe destaque. A floresta, que é importante para todo o planeta, é um dos principais alvos de grupos criminosos ambientais.

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A aplicação da Lei de Crimes Ambientais na Amazônia

Pesquisadores brasileiros analisaram as mudanças ocorridas na aplicação da Lei de Crimes Ambientais na Amazônia, num período de 20 anos, de 2000 até 2020. O estudo, publicado pela Nature, buscou explicar a dinâmica do desmatamento numa das mais importantes florestas do mundo. 

O artigo aponta para a sólida Lei de Crimes Ambientais, existente no Brasil. Menciona, inclusive, a existência de instituições de monitoramento, fiscalização e conservação, como é o caso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Por outro lado, apesar dos recursos existentes, que deveriam fortalecer os processos, a fiscalização e a aplicação dessas leis não se mostra suficiente, passando a sensação de impunidade àqueles que desafiam a legislação.

Dados mostram que entre 2004 e 2012, houve uma queda de quase 84% no desmatamento da Amazônia Legal. Até 2022, o aumento foi de pouco mais de 58%, em relação a 2004. Os dados são do TerraBrasilis, uma plataforma do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e podem ser consultados clicando aqui.

O papel da política na proteção ambiental

De acordo com os pesquisadores, a aplicação da Lei de Crimes Ambientais é essencial para coibir o desmatamento, porém, sua efetividade se mostra variável.

Essa variação pode corresponder às mudanças de governo que, consequentemente, alteram a dinâmica de instituições e órgãos ambientais sob seu comando. Dessa forma, um governo mais ou menos interessado na preservação ambiental impacta, de maneira incisiva, nas operações dos órgãos ambientais. 

Entre outros dados analisados pelos pesquisadores, o período de 2004 a 2008 foi destacado por uma série de acontecimentos.

Em 2004, por exemplo, foi lançado o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm). Durante o seu primeiro período de execução (PPCDAm-I), entre 2004 e 2008, a criação de Unidades de Conservação (UCs) aumentou quase 66%, cobrindo 60.4 milhões de hectares na Amazônia. No mesmo período, a homologação de 24 Terras Indígenas (TIs) contribuiu com o aumento de 8.06 milhões de hectares de áreas protegidas. 

Em relação às infrações, durante esses quatro anos, a quantidade de multas cresceu em 36% e seu valor médio triplicou, de acordo com o estudo, em comparação ao período anterior (1999-2003).

Portanto, o estudo sugere que as mudanças de cunho político têm papel fundamental nos procedimentos e na execução da fiscalização, realizada por agentes ambientais, além de colaborar ou prejudicar o fortalecimento da conservação ambiental

Bruna Chicano

Cientista ambiental, vegana, mãe da Amora e da Nina. Adora caminhar sem pressa e subir montanhas.

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