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Fabiana Magnabosco, Amanda Didoné, Janaína Venzke e Viviani Ruffo sugerem cautela na prescrição de dietas sem glúten para pessoas sem diagnóstico de doença celíaca ou para aquelas que ainda estão investigando, já que não há benefícios evidentes e podem interferir na definição dos sintomas

Por Fabiana Magnabosco, Amanda Didoné, Janaína Venzke e Viviani Ruffo em Jornal da Universidade | A doença celíaca (DC) é uma doença autoimune causada pela ingestão de glúten em indivíduos predispostos geneticamente (Mosca & Pellegrini, 2021). Trata-se de um estado inflamatório da mucosa do duodeno e, consequentemente, pode levar à atrofia completa das vilosidades (dobras dos intestinos) (Ludvigsson et. al., 2013), devido a ação de autoanticorpos contra a transglutaminase-2 tecidual (Mosca & Pellegrini, 2021). 

Outras patologias estão associadas ao consumo de glúten. São as chamadas Desordens Relacionadas ao Glúten (DRGs). Pode ser destacada a Dermatite Herpetiforme (DH), que é uma doença cutânea, crônica e benigna, que se caracteriza pelo aparecimento de bolhas ou feridas e coceira (Salmi, 2019). Também há a sensibilidade ao Glúten Não Celíaca (SGNC), que se manifesta em sintomas semelhantes aos da doença celíaca e alergia ao trigo, sendo um diagnóstico de exclusão, quando os exames para descartar as outras DRGs foram realizados e apresentaram resultado negativo (Schnedl et al., 2017). Outra desordem é a alergia ao trigo, que tem como definição uma resposta imunológica incompatível às proteínas do trigo (Ricci et al., 2019). Há ainda a ataxia por glúten, que é uma condição autoimune na qual os anticorpos ativados pela ingestão de glúten atacam as células do cerebelo (células de Purkinje) e o indivíduo pode ter dificuldades de equilíbrio e para ficar em pé (Rawat et al., 2022).

Os efeitos colaterais do glúten já foram investigados em modelos animais e células in vivo de humanos, contudo se considera que ainda há escassez de estudos prospectivos bem controlados, duplamente cegos, cruzados e de longo prazo de dieta sem glúten.

Dessa forma, pede-se cautela antes de sugerir ou orientar a dieta sem glúten (gluten free diet – GFD) para pacientes que não sejam celíacos (Lerner et al., 2017).

Uma pesquisa sobre uma GFD em pacientes sem doença celíaca encontrou um aumento da incidência das seguintes condições: doença inflamatória intestinal, síndrome do intestino irritável, dentre outras (Blackett et al., 2018). Deve-se ressaltar que pode até ser considerado relativamente fácil se recomendar uma GFD, mas os pacientes que efetivamente realizam uma GFD demonstram bastante insatisfação e vontade de consumir novamente os alimentos da forma que puderam experienciar no passado (Lerner; Mathias, 2017), seja pela qualidade sensorial, seja pela memória afetiva. Além disso, uma GFD pode vir associada a limitações na aquisição, no preparo e no consumo desses alimentos, além de deficiências nutricionais, como baixo teor de vitaminas do complexo B, folato, cálcio, vitamina D, ferro, zinco, magnésio e fibras. 

Acredita-se que o interesse na GFD por indivíduos sem DC ou outra DRG possa ser, em parte, por acreditar em benefícios à saúde proporcionados por essa dieta – os indivíduos acreditam que podem perder peso, melhorar a saúde do trato digestório e outras condições. No entanto, ainda não foi comprovada por pesquisas científicas a efetividade da GFD em fornecer tais benefícios para pessoas que não possuem DRGs.

O consenso científico de que, para indivíduos não sensíveis ao glúten, a remoção do glúten da dieta não melhoraria a saúde permanece

Quando os indivíduos com alguma DRG ainda não estão com o duodeno bem recuperado, podem apresentar intolerância à lactose (IL) secundária, pois a atividade da enzima lactase pode estar diminuída nas microvilosidades. Geralmente é uma deficiência transitória e, após a retirada do glúten, a tendência é que as microvilosidades sejam recuperadas e a atividade da lactase restabelecida (Usai-Satta; Lai; Oppia, 2022). A intolerância à lactose é uma das razões para a responsividade parcial à retirada do glúten na doença celíaca não responsiva, podendo aumentar em torno de 8% a 10% (Aaron, Lerner, et al., 2018). Além disso, para 24% dos pacientes (Ojetti et al., 2005), a deficiência de lactase foi a única manifestação de DC.

Observa-se um crescimento de pessoas sem diagnóstico para DC seguindo uma GFD sem orientação de um nutricionista ou, muitas vezes, orientado por este, devido aos supostos benefícios relatados acima. Merece ser ressaltado que, caso haja relato de sintomas ao ingerir produtos que contenham glúten, antes de se iniciar uma GFD com um nutricionista, o paciente deve ter um acompanhamento com seu médico para a realização dos exames e verificação de alguma DRG. Um diagnóstico conclusivo é considerado difícil; quando se retira o glúten antes de se realizar tais exames, contudo, pode-se dificultar ainda mais o diagnóstico. Por isso, é importante ser acompanhado por uma equipe multidisciplinar composta por médico e nutricionista, a qual fornecerá as orientações corretas aos pacientes.

No caso da adoção de uma GFD, o uso de alimentos nas substituições também precisa ser orientado e acompanhado por nutricionistas para que o paciente não entre em monotonia alimentar e privação absoluta.


Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da Universidade de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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