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Projeto transforma embalagens longa vida em proteção térmica para pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade

Em 2009, uma noite tempestuosa em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, inspirou a criação de um projeto social que mudaria a vida de mais de 500 famílias. A química Maria Luiza Camozzato, tocada pela preocupação e empatia por pessoas vulneráveis a chuvas e frio, foi impulsionada por um “plano divino” para criar algo capaz de diminuir os efeitos do clima em residências sem isolação térmica. 

Em meio aos trovões, a química industrial passou a noite em claro pensando em uma possível solução para diminuir o sofrimento de famílias vulneráveis. 

“Eu aprendi com a minha avó materna que para tudo tem solução. Só não tem solução para morte. E aquilo sempre ficou dentro de mim. E eu fiquei pensando… ‘tem que ter uma maneira de ajudar essas pessoas’”, contou ao eCycle. 

Às seis horas da manhã, Camozzato ouviu algo que pode ser definido como uma intervenção divina, sugerindo que usasse as caixas de leite. Sabendo das propriedades térmicas e isolantes das embalagens longa vida, a química conseguiu dormir, mas com a ideia na cabeça. 

No dia seguinte, a química começou a pesquisar protótipos do que seria uma solução eficiente, barata e sustentável ao problema. Com auxílio de voluntários, Camozzato iniciou o projeto que ficaria conhecido como Brasil Sem Frestas, que utiliza das propriedades isolantes térmicas de embalagens Tetra Pak para minimizar problemas de climatização de casas com isolamento térmico insuficiente. 

Um ano depois da idealização do Brasil sem Frestas, Camozzato e seu time de voluntários fizeram o primeiro revestimento de embalagens cartonadas na casa de uma família em Passo Fundo. Em meio à excitação da ideia do revestimento, o grupo, formado por amigas, ajudou a química a revestir as paredes e o assoalho da casa usando tachas e caixas de leite. 

“Foi uma sensação maravilhosa, a gente viu que podia ser feito e nós tínhamos muito que aprender para melhorar. Mas saímos com aquela sensação de que nossa oração (…) tinha sido o início de um grande, e inimaginável grande, projeto”. 

Desde então, o Brasil sem Frestas se expandiu, confeccionando placas térmicas com uma padronagem específica e auxílio de uma máquina de costura. Atualmente, o projeto funciona em 36 cidades brasileiras.

ONG mexicana constrói casas usando embalagens longa vida

Mas, como o Brasil Sem Frestas funciona?

Dados do IBGE mostram que um a cada 45 milhões de brasileiros moram em uma habitação precária, definida pela Síntese dos Indicadores Sociais como moradias com as seguintes características:

  • Casas construídas com restos de madeira;
  • Casas sem banheiro;
  • Locais onde famílias gastam mais de 30% da renda com aluguel;
  • Moradias sem documento de posse ou propriedade;
  • Habitações onde mais de 3 pessoas dividem o mesmo quarto.

As casas construídas de modo precário tornam seus habitantes vulneráveis a eventos climáticos, incluindo a chuva e ventos fortes — os mesmos que inspiraram Maria Luiza Camozzato para a criação do Brasil sem Frestas

As frestas e fissuras presentes nessas estruturas são — literalmente — aberturas para a passagem de água. Assim, as caixas de leite servem como uma barreira contra esses fatores, além de auxiliar no isolamento térmico das residências. 

Apelidadas de “embalagens longa vida”, as embalagens cartonadas são produzidas através de três materiais principais: o papel, que representa 75% do produto final, polietileno, que representa 20% e, por fim, o alumínio, compondo 5% da embalagem. O revestimento do alumínio é uma das principais características  que proporcionam as propriedades térmicas da caixa de leite.

Segundo um estudo realizado no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense, as embalagens Tetra Pak “possuem uma face aluminizada, a qual impede que o calor seja transmitido para o interior (ou exterior no caso do inverno) da residência pelo processo de radiação, refletindo mais de 95% do calor”. Assim, essas caixas servem como uma alternativa acessível às mantas térmicas que exercem a mesma função. Além disso, outras pesquisas comprovaram o potencial das embalagens como isolantes térmicos. 

A vedação é indicada para qualquer tipo de clima — o que muda é o tipo de aplicação das placas. Em locais mais frios, a parte com alumínio é instalada voltada para dentro da casa, enquanto em locais onde o clima é mais quente, ela fica virada para fora. 

O revestimento com caixas de leite faz com que a diferença térmica interna e externa de uma casa chegue até 8°C. Ou seja, no inverno, ela é responsável por aquecer a residência e, no verão, resfriá-la, proporcionando conforto para os residentes independentemente do clima.  

Durabilidade, reciclagem e compromisso ambiental

Na natureza, se não forem recicladas, as embalagens longa vida possuem uma durabilidade de até 200 anos. Quando são confeccionadas em placas para o revestimento de casas, com o cuidado e a manutenção adequada, como instruído pelo grupo do Brasil sem Frestas, estima-se que o material possa durar cerca de 20 a 30 anos, segundo Camozzato. 

O projeto ainda é relativamente recente para se ter uma ideia da durabilidade do revestimento. No entanto, o time mostra-se disponível para auxiliar casas que necessitem de manutenção. E, além disso, o projeto também oferece tutoriais e o material necessário para que residentes consigam fazer o revestimento sozinhos. 

Para evitar o impacto ambiental dos materiais, tudo que é enviado para a sede do projeto em Passo Fundo é reutilizado ou redirecionado para o melhor fim possível.

“Nós temos uma responsabilidade ambiental bastante grande.”, explica a química, “[Na sede] toda e qualquer caixa que nós não podemos reaproveitar (…) nada volta para a natureza.”

“Nós já retiramos mais de 35 toneladas de embalagens longa vida da natureza. Então a gente tem essa responsabilidade.”

O projeto funciona 100% por meio de doações. Portanto, as tampas de plástico das caixas e qualquer outro material doado que não é utilizado na confecção das placas isolantes é vendido para recicladoras, para que o projeto continue funcionando.

“A gente só não recicla suspiro”, brinca a idealizadora. “Caixas sujas e fora de corte nós também mandamos para a recicladora. Porque nós temos que ter um padrão de caixa, de corte e de limpeza para que as chapas tenham qualidade. Para que as pessoas, quando entrem nas casas delas, tenham o prazer de morar lá dentro. “

Como as placas são feitas? 

Após a doação e coleta de caixas higienizadas, os voluntários separam-nas de acordo com cores e marcas e passam a montar placas térmicas em um esforço coletivo. 

Cada placa é montada com seis caixas de leite, que são abertas e costuradas ou grampeadas juntas. As chapas são então adaptadas (cortadas ou dobradas) de acordo com a estrutura da casa, e grampeadas com auxílio de um grampeador industrial às paredes de madeira. 

Confira o tutorial de revestimento oferecido pelo canal oficial do Brasil sem Frestas no YouTube: 

Impacto positivo 

Em Passo Fundo, o Brasil sem Frestas já revestiu as casas de 534 famílias, fora o número de pessoas que já foram acolhidas pelos projetos de outras cidades. Devido ao esforço coletivo e compassivo dos colaboradores, muitas pessoas vivem, agora, em residências protegidas de eventos climáticos. 

“Eu acho que o maior impacto que existe na vida das pessoas é a dignidade — o aumento da dignidade. 

Tu imagina uma casa cheia de frestas, feita com resto de madeira e tu não imagina quando eu falo isso, da pobreza que existe. E de repente elas recebem uma casa que fica totalmente fechada, revestida nas paredes e no teto e não chove mais dentro, é quentinha no inverno e que se dorme sem vento, sem frio e não se sente mais calor dentro de casa no verão.”, conta Camozzato. 

Como doar para o Brasil Sem Frestas? 

O Brasil sem Frestas atua em 36 cidades brasileiras, incluindo Passo Fundo, onde o projeto foi fundado. A organização aceita doações em sua sede oficial, localizada na Rua Fagundes dos Reis, 97, Rio Grande do Sul. 

Para que possam ser aproveitadas, as caixas Tetra Pak devem ser bem higienizadas antes de serem doadas, pois isso evita a proliferação de vetores de doenças, a contaminação de outras caixas e a exposição de voluntários às embalagens contaminadas. 

Além disso, a padronização das caixas é essencial na produção das chapas térmicas. Desse modo, é recomendado que as embalagens sejam doadas inteiras, para que os voluntários possam cortá-las de forma adequada. 

“É necessário nos doarem as caixas limpas com água e detergente. Você tira a tampa, limpa, escorre umas três ou quatro vezes. Não precisa recortar [as caixas], porque a gente tem um corte padrão. A gente pede também que retirem as tampas para nos doarem separadamente, porque fechando [as caixas] elas podem ser contaminadas, se não estão bem limpas. Além da umidade que pode alterar um pouco a qualidade”, explica Camozzato.

Se você não mora no Rio Grande do Sul e mesmo assim quer colaborar com o projeto, saiba que o Brasil sem Frestas de Passo Fundo aceita qualquer tipo de doação realizada pelos correios para o endereço Rua Fagundes dos Reis, 97, Passo Fundo, Rio Grande do Sul — 99010-070. 

Quer se tornar voluntário ou multiplicador do projeto em sua cidade e continuar o trabalho solidário de Camozzato? Entre em contato com a página oficial do Brasil sem Frestas e tire suas dúvidas.

“O fato de você poder levar saúde a essas pessoas, aos seus filhos, para os mais velhos, para os moradores, é algo muito gratificante. Porque você dá cidadania para essas pessoas. Elas se sentem participantes e aumenta a autoestima delas. (…) É possível, com pequenas ideias, mudar o mundo.”, finaliza a idealizadora do projeto. 


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