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Diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático criou o conceito de limites críticos para o planeta continuar habitável

Por Marcos Pivetta – Revista Pesquisa Fapesp | O cientista do sistema terrestre Johan Rockström, um sueco de 59 anos, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático, na Alemanha, coordenou os estudos que levaram à criação do conceito de limites planetários. A expressão designa nove sistemas biofísicos e processos fundamentais para a Terra continuar habitável.

Em setembro de 2025, Rockström e seus colaboradores lançaram a segunda edição de um relatório anual que faz um check-up da “saúde” do planeta. A partir de uma série de parâmetros, cada um dos nove limites recebe um diagnóstico de sua situação – se está na zona de segurança, de risco ou de alto risco.

O mais recente relatório elevou de seis para sete os limites planetários que inspiram preocupação. Apenas dois, a situação da camada de ozônio e a produção de aerossóis, foram aprovados. Quatro foram classificados no nível mais crítico: mudanças climáticas, integridade da biosfera, modificação dos fluxos biogeoquímicos e introdução de materiais feitos pelo homem na natureza. Três foram considerados em risco: mudanças no uso da terra (florestas e áreas verdes), conservação da água doce e acidificação dos oceanos. No relatório anterior, os oceanos ainda estavam na zona segura. Nesta entrevista, Rockström fala dos resultados de seus estudos.

O que são exatamente os limites planetários?

São os processos ambientais que regulam a estabilidade e o funcionamento do planeta, analisados a partir do estado da arte do conhecimento científico. Dessa forma, é possível identificar variáveis de controle para cada um desses processos limítrofes, basicamente conjuntos de dados que sejam bons indicadores de sua situação, como a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera. Se estivermos dentro desses limites críticos, provavelmente seremos capazes de permanecer vivos em um estado interglacial semelhante ao dos últimos 12 mil anos do Holoceno [época geológica em que vivemos]. Mas, se os ultrapassarmos, corremos o risco de nos afastar das atuais condições de vida. Identificar os limites críticos é mais fácil do que definir o seu estado. Apenas em 2023, tivemos informações suficientes para quantificar o estado dos nove limites. Hoje diria que muita ciência é necessária para reduzir as incertezas e aperfeiçoar ainda mais as variáveis de controle. Mas esses nove limites parecem bem robustos e cientificamente justificados.

Quais são as diferenças entre os limites planetários e os pontos de inflexão, de não retorno, de um sistema?

Uma explicação simples é que estabelecemos os limites planetários para que os pontos de não retorno não sejam ultrapassados. Os pontos estão sempre relacionados a componentes específicos do sistema, como a floresta amazônica, os recifes de corais tropicais, a corrente marinha Amoc, a camada de gelo da Groenlândia e da Antártida Ocidental. Podemos então dizer, com alto nível de confiabilidade, que não vamos ultrapassar os pontos de não retorno se estivermos dentro dos limites planetários. Quanto mais estressamos os limites, mais perto estamos de ultrapassar os pontos de não retorno. Esse é, por exemplo, o caso da Amazônia, que faz parte dos limites planetários do uso da terra. Se uma floresta tropical é pressionada demais, pode mudar de estado e virar uma savana.

A alteração teria que ser de que ordem para que isso ocorra?

A ciência mais atualizada indica que, se houver uma perda de aproximadamente 25% da cobertura de árvores, há cerca de 50% de risco de que a floresta entre em um ponto de não retorno. Se a floresta for levada ao limite, por meio do desmatamento, da perda de biodiversidade, das mudanças climáticas, o sistema entrará em colapso em um ponto muito preciso. E este ponto preciso é quando o sistema de rios voadores parar de funcionar. Se isso ocorrer, o sistema deixa de se autoumidificar e passa a se tornar mais seco. Enquanto tivermos os rios voadores, a Amazônia será uma floresta tropical.

“Enquanto a Amazônia tiver os rios voadores, ela será uma floresta tropical. Se eles desaparecerem, pode virar uma savana”.

Esses limites planetários estão todos interconectados?

Pelo menos alguns deles, talvez a maioria, estão interligados. As mudanças climáticas, tema dessa conferência, são um deles. Elas influenciam alguns limites e são influenciadas por outros.

O que levou a acidificação dos oceanos a saltar em apenas um ano da zona segura para a de risco?

Infelizmente, a acidificação do oceano continua piorando ano a ano. Há uma redução linear do seu pH, que mede a acidez. Simplesmente acabamos de passar do limite seguro. Mais ácido, o oceano decompõe o carbonato de cálcio, que é o componente básico para toda a vida que depende de conchas. Ele se torna mais corrosivo para os seres vivos. Essa é a primeira razão para a mudança de status. A segunda é que estamos fazendo grandes atualizações sobre a ciência dos oceanos, temos mais informações. Prevejo que teremos de adicionar mais parâmetros para medir a segurança dos oceanos, como a pesca em excesso, o aquecimento das águas, os níveis de oxigênio, a presença de microplásticos.

O senhor já esteve em várias COP. Como avalia o papel da conferência para conter as mudanças climáticas?

Precisamos reformar a COP, porque ela não está mais funcionando. Há dois anos, ao lado de Sandrine Dixson-Declève, do Clube de Roma [organização informal que discute temas globais], mandei uma carta para Simon Stiell, presidente da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas [UNFCCC], sugerindo uma reforma na COP. Comecei a carta dizendo que a primeira coisa que o mundo deveria fazer é comemorar o fato de que, após mais de 30 anos, as negociações climáticas chegaram ao fim. Não precisamos de mais negociações. Todos os componentes legais [para atuar] já existem. Sabemos monitorar a temperatura do planeta. Temos mecanismos de financiamento climático. Conhecemos os danos causados pelos combustíveis fósseis. Tudo está pronto. Não precisamos mais debater. Temos de diminuir as emissões e nos adaptarmos às mudanças do clima. No modelo atual das COP, ficamos revisitando coisas antigas o tempo todo. Na verdade, nem precisamos de um compromisso anualmente negociado, que, aliás, ninguém realmente cumpre.

O foco deve ser mais ação e menos discussão?

A COP deve se tornar uma reunião de implementação. Precisamos que elas se tornem muito mais orientadas para o trabalho. Precisamos de instâncias em que todos os países sejam responsabilizados e a ciência esteja muito mais presente para ajudar continuamente no alinhamento do que está sendo proposto para o mundo real. A ciência diz que é preciso reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 5% ao ano. E o que os países dizem, no papel, que farão? Que reduzirão em 5% as emissões em 10 anos. Hoje, há uma diferença de 10 vezes entre o que a ciência prega e a meta de cortes dos países.

Este texto foi originalmente publicado pela Revista Pesquisa Fapesp, de acordo com a licença CC BY-SA 4.0. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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