Foto de Leopoldo Silva/Agência Senado, sob CC BY 2.0 no Flickr
Já parou para pensar na quantidade de resíduos que você gera ao longo da sua vida? Dos resíduos orgânicos aos secos, o que costumamos – de forma equivocada – chamar de “lixo”, na verdade representa um grande desafio para a sociedade atual.
Um levantamento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) mostrou que, em média, cada pessoa no mundo gera entre 0,5 kg até quase 2,5 kg de resíduos diariamente. Com mais de 8 bilhões de pessoas no planeta, é fácil entender porque a gestão de resíduos – principalmente dos orgânicos – se tornou um dos maiores desafios ambientais da atualidade.
Já no Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), cada pessoa gera, em média, pouco mais de 1 kg de resíduos sólidos urbanos (RSU) todos os dias. Isso significa que, em apenas um ano, cada pessoa no Brasil produz, em média, 382 kg de resíduos. Boa parte disso poderia ser evitada ou, ainda, transformada.
Mas o que compõe todo esse volume de resíduos? Dados coletados pelo Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa), entre 2019 e 2023, mostram que de todos os RSU coletados nesse período, quase metade (43,2%) de tudo o que descartamos é composto por resíduos orgânicos – como restos de alimentos e materiais biodegradáveis.
Com isso em mente, te convido a refletir sobre o destino que damos aos resíduos que produzimos. Afinal, todo resíduo que geramos causa algum tipo de impacto no planeta. Será que o hábito de “jogar fora” é realmente a única solução?
É possível medir o impacto de simplesmente enviar nossos resíduos para aterros sanitários – ou ainda lixões, que, embora proibidos, ainda são a realidade em muitas cidades no Brasil? Alternativas como compostagem ou o uso de recicladoras domésticas podem fazer a diferença?
Para entender esses pontos, continue a leitura!
Antes de tudo, é preciso entender o que são resíduos orgânicos. Os resíduos orgânicos são aqueles que têm uma origem biológica, ou seja, não são produzidos de forma artificial ou manipulada. A geração desses resíduos pode ter base doméstica, urbana, agrícola ou industrial.
Esse tipo de resíduo é geralmente composto com restos de alimentos, cascas de frutas ou legumes, borra de café, resíduos de jardinagem, como folhas de árvores e galhos, restos de animais, resíduos agrícolas e até o lodo formado em estações de tratamento de esgoto. Em suma, são materiais que tendem a se decompor naturalmente com o tempo, dentro de ambientes naturais equilibrados.
Apesar da decomposição desses elementos fazer parte de um processo natural, o grande problema está justamente no volume gerado e na disposição inadequada desses resíduos.
Os resíduos orgânicos representam quase metade de todo lixo gerado no ambiente doméstico. Descartar todo esse resíduo de forma inadequada tem potencial para agravar impactos ambientais importantes. Pode aumentar, inclusive, a emissão de gases de efeito estufa (GEE).
Apesar de sua origem biológica, e de seu potencial de transformação com soluções como a compostagem, por exemplo, os resíduos orgânicos ainda são descartados, majoritariamente, como lixo comum e são destinados para os aterros sanitários. No caso do Brasil esse problema é amplificado com a existência de mais de 3 mil lixões ativos no país.
Esse modelo de descarte é problemático por várias razões, aqui estão algumas:
Na prática, os impactos da sobrecarga e má gestão de resíduos vai além do que podemos ver. Além dos custos diretos da gestão de resíduos sólidos, realizada geralmente pelas prefeituras, também existem custos indiretos.
De acordo com o Pnuma, os custos indiretos englobam externalidades negativas que podem estar relacionadas às consequências da degradação ambiental. Desse modo, são considerados os prejuízos causados à saúde humana e à biodiversidade, a perda de serviços ecossistêmicos e as consequências ambientais e climáticas impostas ao planeta.
Por outro lado, existem soluções sustentáveis para a gestão de resíduos, baseadas nos “3 Rs”: reduzir, reutilizar e reciclar. No caso dos resíduos orgânicos, reduzir o desperdício de alimentos é um primeiro passo essencial para o manejo sustentável de resíduos:
Essas são apenas algumas maneiras, simples porém eficazes, para evitar a geração de ainda mais resíduos. Além de serem uma ótima forma de economia doméstica.
Mas o que fazer com os resíduos orgânicos que não conseguimos evitar? Existem alternativas muito mais sustentáveis do que o descarte em aterros ou lixões. Alternativas viáveis de reciclagem que podem ser feitas dentro de casa. A maneira como lidamos com isso faz toda a diferença:
E de que forma isso pode ser feito? Existem algumas opções:
Mas será que compostar é uma solução viável para todo mundo? Até para quem vive em apartamento? A resposta é sim. Algumas dessas soluções são perfeitamente adaptáveis para quem não tem muito espaço. Tanto a vermicompostagem, como a compostagem tradicional podem ser feitas em composteiras compactas. Ao contrário do que algumas pessoas podem pensar, quando manejadas corretamente, as composteiras não exalam qualquer mau cheiro ou atraem insetos.
Essas são práticas que tornam possível diminuir o impacto ambiental da geração de resíduos orgânicos a partir de casa, com total autonomia. Mas mesmo com todas essas possibilidades, há resíduos que ainda geram dúvidas ou exigem atenção.
Então, compostar é a solução para todo tipo de resíduo orgânico gerado? Infelizmente, não. Apesar de ser acessível e eficiente, a compostagem também tem suas limitações e nem todo resíduo é adequado para esse processo. Isso porque alguns compostos, como carnes, laticínios, ossos, alimentos muito gordurosos, contaminados, com excesso de sal, por exemplo, podem comprometer o equilíbrio no processo de compostagem. Além de correrem o risco de gerar algum odor, atrair insetos ou oferecer algum risco de contaminação.
Saiba mais sobre o que pode e o que não pode entrar na composteira com nossa matéria:
O que fazer com esses resíduos? Aí entram os recicladores domésticos, que ampliam as possibilidades de reaproveitamento dos resíduos orgânicos. Eles processam muitos dos itens que não podem ser compostados.
Ainda assim, existem algumas exceções, como ossos muito grandes, que não podem ser compostados, nem colocados na recicladora. Os ossos são formados, principalmente, por cálcio e fósforo, o que os torna resistentes às bactérias que atuam na decomposição. E uma vez na recicladora doméstica, podem danificar o equipamento.
Apesar de existirem boas soluções para os resíduos orgânicos, ainda há alguns desafios que exigem criatividade, responsabilidade compartilhada e inovação contínua. Em um cenário em que cada gesto importa, entender e aprimorar o destino dos resíduos orgânicos é um passo essencial para um cotidiano mais sustentável. Afinal, cada restinho conta – e o que você escolhe fazer com seus resíduos orgânicos pode ajudar a transformar o futuro do planeta.
Mas afinal, qual o papel da compostagem doméstica na redução de gases de efeito estufa? Entender esse processo é fundamental para compreender como nossas escolhas diárias causam impacto e influenciam nas mudanças climáticas.
Descubra tudo sobre a compostagem doméstica com as nossas matérias:
A emissão de gases de efeito estufa é apenas um dos diversos impactos negativos relacionados ao não reaproveitamento dos resíduos orgânicos. Alguns desses impactos podem passar despercebidos no dia a dia, mas não deixam de trazer consequências reais para o meio ambiente.
O descarte em aterros sanitários ou lixões, por exemplo, envolve uma complexa operação logística de coleta e transporte desses resíduos. Demanda mão de obra, infraestrutura e queima de combustíveis fósseis. O conjunto desses fatores contribui tanto para as emissões indiretas de gases de efeito estufa, quanto para outros custos socioeconômicos que já mencionamos anteriormente.
Levando isso em conta, a equipe do eCycle se dedicou a um estudo detalhado para entender melhor como o destino dos resíduos orgânicos gerados no nosso dia a dia pode impactar o meio ambiente. Especialmente em relação às emissões diretas de gases de efeito estufa, que agravam as mudanças climáticas e aceleram o aquecimento global.
Com base em dados e referências científicas confiáveis – incluindo premissas empregadas pelo IPCC – desenvolvemos um cálculo capaz de estimar a quantidade de CO2 equivalente (CO2e) liberado para a atmosfera, a partir da decomposição de resíduos orgânicos em dois cenários: depositados em aterros sanitários e na compostagem doméstica.
Vale destacar que nossa metodologia considera apenas as emissões diretas do processo de decomposição dos resíduos, mas não considera as emissões ligadas à coleta e transporte que, embora relevantes, ficaram fora do escopo da nossa análise.
Em uma análise comparativa, aplicando nosso cálculo de impacto no descarte de uma sacolinha plástica de supermercado, com cerca de 3 kg de restos orgânicos, observamos uma diferença entre os dois cenários.
E a diferença é expressiva: os resultados mostram que, ao optar pela compostagem doméstica em vez de enviar os resíduos para o aterro, é possível reduzir quase 40% das emissões de gases de efeito estufa associadas à decomposição desses materiais.
Além disso, esses resultados estão alinhados com evidências científicas. Um estudo publicado em 2023 pela revista Nature, mostrou que a compostagem doméstica tem potencial para reduzir entre 38% e 84% as emissões de gases de efeito estufa, comparando aos aterros. A pesquisa também chama a atenção para o fato de que mais de um terço dos alimentos produzidos em todo o mundo acabam sendo desperdiçados. O que contribui para o aumento das emissões.
Mas por que essa variação tão grande nos índices de redução? Isso ocorre principalmente por conta da composição e umidade presente nos resíduos orgânicos. Bem como a temperatura e umidade locais no aterro sanitário. Fatores que podem variar bastante.
Outro estudo, publicado pela Science Direct em 2022, reforça que a decomposição de resíduos em aterros sanitários é responsável por cerca de 12% das emissões globais de CH4. De acordo com a Pnuma, em um período de 20 anos, o CH4 liberado na atmosfera se torna um poluente poderoso, com mais de 80 vezes o potencial de aquecimento global do CO2.
Esses dados reforçam o que nossa análise também demonstrou: a compostagem doméstica é uma ação simples e uma ferramenta poderosa, principalmente quando o assunto é o clima. Além da redução direta no nível de emissões de gases de efeito estufa, compostar em casa alivia a pressão do sistema de coleta pública. Também amplia a vida útil dos aterros sanitários, cada vez mais sobrecarregados por todo o País.
Quer entender melhor os conceitos técnicos por trás das mudanças climáticas? Confira algumas das nossas matérias que explicam os fundamentos:
A compostagem doméstica é uma escolha que começa com algo tão simples quanto repensar o destino da sua sacolinha de lixo orgânico. Por outro lado, nem todo resíduo orgânico pode ir para a composteira – e é aí que entra outra solução: o reciclador doméstico.
A verdade é que nem tudo vai para a composteira – e tudo bem. Alguns resíduos, como mencionamos anteriormente, exigem cuidados específicos. Se depositados em composteiras caseiras, correm o risco de atrair insetos indesejados e vetores de doenças. Além de comprometer o equilíbrio do sistema.
Apesar disso, já existe um equipamento capaz de transformar elementos que não se adaptam à compostagem tradicional: o reciclador doméstico.
O reciclador doméstico foi criado para lidar com aqueles resíduos orgânicos que não são adequados para o processo de compostagem, como restos de carne, por exemplo. Esse equipamento atua com calor e movimentos mecânicos, funcionando a partir do controle de umidade, temperatura e aeração do composto. São três principais etapas:
Em algumas horas ele é capaz de transformar restos de alimentos, por exemplo, em um material seco e sem qualquer cheiro. Além disso, o composto final:
O reciclador doméstico é um importante complemento à compostagem, já que atua como uma solução para muitos elementos que não se adequam à composteira. Mas, por ser um equipamento elétrico, outros pontos também merecem ser avaliados.
Saiba mais sobre o funcionamento do reciclador doméstico na nossa matéria:
Apesar de não haver emissão de gases de efeito estufa durante as etapas de reciclagem do equipamento, há consumo de energia elétrica para o seu funcionamento. Será então que o uso do reciclador doméstico é realmente viável?
Para analisar o impacto do equipamento e responder essa pergunta, a equipe do eCycle considerou as emissões associadas ao consumo de energia elétrica do reciclador com as emissões de CO2e geradas pela decomposição da mesma quantidade de resíduos em um aterro sanitário, no período de um mês.
Para esse cálculo, consideramos dados oficiais sobre a matriz elétrica brasileira. Vale lembrar que o Brasil tem mais de 80% de sua matriz composta por fontes renováveis.
O comparativo foca apenas nas emissões diretas da decomposição e da geração de energia elétrica, sem considerar fatores como:
Os resultados mostraram que, mesmo ao superdimensionar as estimativas de uso do equipamento doméstico, as emissões de CO2 relacionados à geração da energia elétrica consumida para seu funcionamento não atingem nem 0,2% das emissões de CO2e, estimadas para a decomposição em aterro da mesma porção de resíduos orgânicos.
Vale reforçar que quando usamos o termo “superdimensionar”, é considerado o uso contínuo do equipamento, em sua potência máxima. O que dificilmente ocorre na prática.
Mesmo com o uso de eletricidade, as emissões relacionadas à reciclagem dos resíduos em casa gera um impacto muito menor do que acontece com a decomposição da matéria orgânica em aterros sanitários.
O infográfico abaixo mostra um comparativo da geração de CO2 equivalente dos três destinos discutidos até aqui – aterro sanitário, compostagem doméstica e reciclador doméstico – para os resíduos orgânicos produzidos em casa. Ao aplicar a nosso cálculo, vamos considerar o descarte de 2 kg de restos de comida.
Apesar de serem soluções viáveis, a verdade é que nem todo resíduo orgânico pode ser tratado com a compostagem ou o reciclador doméstico. Ainda sobra uma pequena parcela de resíduos que não se encaixa em nenhuma dessas soluções. E agora?
Como mencionado anteriormente, os ossos bovinos e suínos não podem ser compostados, tampouco colocados na recicladora doméstica. Outro exemplo é o chocolate, rico em gordura e açúcar.
Nesses casos, algumas possíveis alternativas são:
Essas não são soluções muito acessíveis do ponto de vista doméstico. Esse fator reforça a importância de segregar corretamente os resíduos em sua origem. Quanto mais separamos corretamente, menos resíduos difíceis restam.
Mais importante do que conhecer as soluções para lidar com os resíduos orgânicos é colocá-las em prática. Dentro de cada realidade, casas espaçosas ou apartamentos apertadinhos, pequenos gestos podem fazer toda a diferença quando o assunto é reduzir emissões de gases de efeito estufa.
Sempre que determinado resíduo não for recomendado para compostagem, mas puder ser transformado em composto seco.
Para resíduos que não podem ser compostados nem reciclados, o ideal é buscar soluções comunitárias dentro do seu município. Pesquise sobre pontos de coleta de resíduos orgânicos, cooperativas ou campanhas de compostagem.
Aproveite e encontre o destino correto para mais de 150 tipos de resíduos com o buscador eCycle.
O nosso papel no manejo de resíduos é bem claro: enquanto cidadãos, somos parte fundamental para uma boa gestão dos RSU. Embora muito possa ser feito dentro de casa, políticas públicas eficazes, aliadas à educação ambiental, são essenciais para ampliar o acesso à ações sustentáveis quando o assunto é descarte de resíduos.
Iniciativas que incentivem a segregação de resíduos na origem, infraestruturas adequadas para seu recebimento e tratamento, além de campanhas de conscientização, podem educar, transformar hábitos e reduzir os impactos ambientais causados pela geração de lixo.
É de nossa responsabilidade o destino que damos aos resíduos que produzimos. Cada gesto, por menor que pareça, carrega um enorme potencial de transformação.
Quando se trata de lixo, cada restinho conta:
Reduzir o desperdício, compostar e reciclar são atitudes de começam em casa. Cada mudança de atitude faz toda a diferença e a soma dos nossos gestos pode frear as mudanças climáticas, resultando num futuro muito mais sustentável. Que tal fazer de cada restinho uma nova possibilidade?
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