São 27 agrotóxicos na água para consumo humano e entre as mais de 2.300 cidades estão São Paulo, Ribeirão Preto, Bauru, São Carlos, Piracicaba, Pirassununga e Lorena
Por Karla Rodrigues em Jornal da USP — Uma mistura de diferentes 27 agrotóxicos foi encontrada na água para consumo humano em mais de 2,3 mil cidades em todo o País. Os dados são do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água (Sisagua), divulgado em março último. Entre as cidades estão São Paulo, Ribeirão Preto, Bauru, São Carlos, Piracicaba, Pirassununga e Lorena.Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.
Na lista de substâncias encontradas, 16 são classificadas pela Anvisa como extremamente ou altamente tóxicas e 11 estão associadas ao desenvolvimento de doenças crônicas. O professor do curso de Medicina da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB), da USP, Luiz Fernando Ferraz da Silva, especialista em medicina ambiental, explica que o prejuízo à saúde é desencadeado a longo prazo. “Alguns elementos químicos presentes nos agrotóxicos podem ter efeito cumulativo, ou seja, você ingere um pouco hoje, um pouco amanhã, um pouco mais para frente. Ao longo de muitos anos, esse efeito pode interferir na função dos órgãos”.
Isso ocorre porque, ao ingerir a substância, o organismo inicia o processo de eliminação do elemento. Esse processo causa um sobrecarregamento dos órgãos, principalmente do fígado, já que ele é responsável por essa função, segundo Ferraz. Além disso, o especialista enfatiza que, por conta dessa sobrecarga de metabolização, no longo prazo ela pode causar neoplasias – crescimento do número de células, conhecido como tumor, –, gerar inflamações crônicas e doenças autoimunes, doenças em que o sistema imunológico ataca o próprio corpo.
Consumo cresce
Apesar dos impactos negativos à saúde, o Brasil é um grande consumidor de agrotóxicos. De 2006 a 2017, o consumo cresceu 20,4% segundo o IBGE. O índice alto é explicado pelo modelo de agricultura adotado no País. Para a professora da Faculdade de Tecnologia da Unicamp, Gisela de Aragão Umbuzeiro, especialista em toxicologia ambiental, essa cultura agrícola é a principal causadora da contaminação da água, mas ressalta que abandonar o uso da substância, apesar de ideal, ainda é inviável. Por isso, para ela, buscar outras alternativas pode ser a solução. Evitar a aplicação dessas substâncias em áreas de aquíferos, ter uma mata ciliar para evitar que esses compostos atinjam os meios aquáticos, além de utilizar o mínimo desses produtos são algumas medidas eficazes para a toxicologista.
De acordo com Gisela, nem sempre é possível detectar quimicamente a presença de um agrotóxico na água, especialmente quando presente em concentrações muito baixas. “Os nossos métodos químicos, apesar de cada vez mais sofisticados, não conseguem detectar”, afirma a professora. Assim, quando há um composto altamente tóxico que precisa ser regulamentado em quantidades extremamente baixas, a única maneira é deixar de utilizar a substância, enfatiza a especialista.
Em nota, a prefeitura de Ribeirão Preto informou que o Saerp verificou as informações inseridas pelo Sisagua e constatou falha na transcrição de dados que, segundo a prefeitura, foi comprovada através do laudo emitido pelo laboratório. O órgão municipal afirma que está realizando análises regulares da água da cidade e não identificou nenhuma alteração. O Jornal da USP também procurou o Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo para falar sobre o assunto, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.