Entenda o que é a twilight zone, uma área do oceano que fica abaixo da superfície
Mesmo que compartilhe o nome com a famosa série norte-americana de 1959 de Rod Serling, a twilight zone não é um universo de ficção científica e terror — mesmo que tenha algumas características semelhantes.
A twilight zone é uma camada de água que fica de 200 a mil metros abaixo da superfície do oceano. Também conhecida como água média ou mesopelágica, a área não está ao alcance dos raios solares e, por isso, é iluminada por flashes de bioluminescência — um tipo de luz produzida por organismos vivos.
Embora sua profundidade, a twilight zone é cheia de vida. De fato, especialistas sugerem que a biomassa de peixes na zona pode ser dez vezes maior do que se pensava anteriormente — mais do que em todo o resto do oceano combinado, contendo 95% do peso dos peixes do mundo. A fauna do local varia de tamanho, incluindo desde animais microscópicos até alguns comparáveis aos maiores do planeta.
A twilight zone ainda é majoritariamente inexplorada. Sendo assim, a biodiversidade local encontra-se além do alcance da pesca comercial — e das leis internacionais que regem o alto mar. No entanto, isso não significa que a área não sofre com as consequências das mudanças climáticas e outros impactos ambientais impulsionados pelo ser humano.
A estranha biodiversidade da twilight zone
Os animais que habitam a twilight zone são, possivelmente, os mais estranhos do mundo. Essa área do oceano é lar de todas aquelas espécies esquisitas que, uma hora ou outra, ressurgem na internet causando alvoroço, ou que já fazem parte dos pesadelos de parte da população.
A fauna inclui bactérias microscópicas e pequenos animais conhecidos como zooplâncton, juntamente com crustáceos maiores, peixes, lulas e muitos tipos de animais gelatinosos. Grande parte desses animais se adaptaram para habitar águas profundas, com uma pressão imensa e temperatura congelante.
Assim, muitos desenvolveram, com o passar do tempo, características como a bioluminescência ou bocas enormes para aproveitar ao máximo os raros encontros com presas no escuro.
Além disso, alguns peixes usam uma adaptação chamada contrailuminação para evitar serem vistos por potenciais predadores. Como a luz na twilight zone vem de cima, muitos predadores olham para cima em busca de presas que se destacam na superfície. Consequentemente, alguns peixes pequenos possuem fileiras de órgãos chamados fotóforos ao longo do ventre, que emitem luz semelhante em intensidade e cor à luz da superfície da água, tornando-os quase invisíveis quando vistos de baixo.

Importância
Assim como qualquer outro ecossistema marinho, a twilight zone é de extrema importância para a biodiversidade aquática. A área não é apenas rica em peixes e outros animais, como também faz parte intrínseca da grande cadeia alimentar dos oceanos.
Animais mortos e “neve” marinha — aglomerados de plâncton morto, bactérias, pelotas fecais e outras partículas ricas em carbono orgânico — afundam das águas superficiais através da zona até o oceano profundo, fornecendo alimento para os animais da área. Semelhantemente, baleias, atuns, peixes-espada, tubarões e outros grandes predadores mergulham profundamente na zona para se alimentar.
E, porque esses animais são importantes para a alimentação humana, nós também somos dependentes da biodiversidade encontrada na twilight zone.
Capacidade de armazenamento de carbono da twilight zone
Porém, não é apenas para a cadeia alimentar que a zona mesopelágica do oceano contribui.
Em geral, todo o oceano já possui a capacidade de absorver uma certa quantidade de dióxido de carbono emitido pelos seres humanos. Entretanto, a twilight zone desempenha um papel importante na transferência de carbono da água da superfície para o oceano profundo, impedindo que ele retorne ao ar como um gás de efeito estufa que retém o calor.
Esse processo é conhecido como a “bomba biológica” do oceano, e depende de fatores como:
- Fitoplânctons: microrganismos que usam carbono para se desenvolver. São parte vital da cadeia alimentar do oceano, criando enormes quantidades de novo material vegetal a cada ano, e estão presentes na área mesopelágica.
- Animais migratórios: muitos animais da área sobem até a superfície à noite e descem novamente para as profundezas para respirar durante o dia, transportando dióxido de carbono da atmosfera e armazenando-o nas profundezas do oceano.
- “Neve” marinha: esses resíduos afundam no oceano, levando consigo grandes quantidades de carbono. Quanto mais profundo afunda, mais tempo o CO2 permanece longe da atmosfera. Pequenas criaturas, como copépodes, alimentam-se ativamente da neve marinha, o que significa que 90% é reciclada na na área. 10% da neve marinha afunda ainda mais, o que é importante para ajudar a manter os níveis de CO2 atmosférico mais baixos do que seriam de outra forma.
A ameaça humana à grande estranheza
Mesmo longe da superfície, a área mesopelágica sofre com a ação humana, assim como todo o oceano em geral. Atividades como a mineração em alto mar e a pesca contribuem grandemente para a perturbação da twilight zone.
No caso da mineração, por exemplo, resíduos da extração podem ser liberados, impactando o ecossistema.
Contudo, as ações indiretas do ser humano, como a sua contribuição para o aumento da temperatura oceânica também impactam esse ecossistema. Uma pesquisa, por exemplo, revelou que até mesmo os corais da twilight zone, metros abaixo da superfície, estão sofrendo com o fenômeno conhecido como branqueamento dos corais.
“Não era algo que esperávamos ver”, disse Nicola Foster, que estuda ecossistemas de corais de águas mais profundas, chamados recifes mesofóticos, na Universidade de Plymouth, na Inglaterra, ao Scientific American.
Os recifes mesofóticos pareciam estar protegidos do aumento da temperatura da superfície do mar, que branqueia os corais mais altos. Mas as observações da equipe, publicadas na Nature Communications, mostram o caso mais profundo de branqueamento já registrado — sugerindo que recifes semelhantes são mais vulneráveis do que se pensava anteriormente.
O branqueamento geralmente ocorre quando o aquecimento da água estimula os corais a expelir as algas coloridas que vivem em seus tecidos e ajudam a sustentá-los. Embora as águas superficiais não estivessem atipicamente quentes quando Foster e sua equipe fizeram as medições, as águas da twilight zone estavam próximas dos 29 graus Celsius — muito acima da faixa de 20 a 24 graus Celsius na qual os corais mesofóticos prosperam.
Felizmente, os corais do estudo recuperaram em grande parte a cor em 2022, segundo Foster. Mas cada branqueamento estressa os corais e, se prolongado, pode levá-los à inanição, causando mais danos ainda ao ecossistema marinho.