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Termo é novo, mas a prática do ecocídio já ocorre há muito tempo, entre os mais diversos seres

O ecocídio, também chamado de suicídio ecológico, é um termo que se refere à extinção de uma população causada pelo desequilíbrio entre a disponibilidade de recursos naturais e a forma de consumo. O exemplo de ecocídio mais emblemático é o caso dos habitantes da Ilha de Páscoa, que morreram por conta da má gestão dos recursos naturais dos quais dependiam para viver. Mas o suicídio ecológico também pode acontecer com populações de outras espécies.

Muitos animais são capazes de alterar seu habitat até o ponto de destruí-lo. As bactérias do gênero Paenibacillus, por exemplo, diminuem significativamente o pH do seu ambiente. Quando a densidade populacional é alta, elas tornam o meio tão ácido que resulta na rápida e completa erradicação da comunidade microbiótica. De acordo com um estudo publicado pela Revista Nature, esse fenômeno aconteceu com um quarto das cepas bacterianas testadas.

Na década de 1930, um dos fundadores da ecologia, WC Allee, observou que, para muitas espécies, a aptidão aumenta com a densidade populacional. No entanto, estudos posteriores mostraram que o oposto parece ser verdadeiro  —populações de baixa densidade prosperam enquanto as de alta densidade tem como destino a destruição ecológica.

Ainda mais surpreendente é a constatação de que substâncias usadas para matar bactérias — como antibióticos na medicina, ou sal e etanol na preservação de alimentos — podem realmente salvar populações dessas bactérias e permitir que elas cresçam.

Mas como a evolução poderia levar a tal situação?

O ecocídio pode estar ligado a algo mais ameaçador: o “suicídio evolucionário“. Acredita-se que a extinção de uma espécie ocorre quando o ambiente muda e ela é incapaz de se adaptar. O suicídio evolutivo é uma explicação alternativa, na qual a evolução seleciona adaptações que são benéficas para os indivíduos, mas que são fatais para as espécies. Pesquisadores do tema sugerem que as bactérias podem ter evoluído para metabolizar nutrientes de forma rápida, mas produzindo subprodutos ácidos: em um ambiente onde os nutrientes são escassos, isso produz vantagens para o indivíduo, mas cria problemas para o grupo quando a densidade populacional aumenta.

Seria muito proveitoso para nós, enquanto humanos, entender esses exemplos como uma advertência, em vez de uma prévia do nosso destino. Ao poluir o ar ou jogar substâncias tóxicas na água, a humanidade está se matando aos poucos, assim como algumas bactérias criadas em laboratório cujas secreções ácidas acabam por inviabilizar sua própria vida.

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Além da carência de comida ou do esgotamento de recursos naturais que causam a extinção da espécie, o ecocídio também pode se dar por razões como a falta de colaboração entre espécies ou populações. Esse foi o caso dos nórdicos que viviam na Groenlândia e se recusaram a interagir e aprender com os Inuit, esquimós com os quais dividiram a ilha entre 984 d.C., quando ali chegaram, e meados do século XV, quando sua sociedade entrou em colapso e desapareceu.

O biogeógrafo Jared Diamond, da Universidade da Califórnia e autor do livro Armas, Germes e Aço, conta que seus alunos lhe perguntam como os habitantes da Ilha de Páscoa não perceberam o que estava acontecendo e o que disseram quando a última palmeira do local foi destruída. A reflexão vale também para as ações humanas da atualidade, reflete um professor em uma palestra no TED Talks: se tais ações parecem inacreditáveis no passado, ele diz, “no futuro parecerá inacreditável o que nós estamos fazendo hoje”, referindo-se ao aumento da poluição atmosférica, às mudanças climáticas e a escolhas de curto prazo motivadas por interesses meramente econômicos de grupos de elite minoritários.

O fenômeno do ecocídio não é novo, mas é pouco estudado. O estudo publicado na revista Nature sobre as bactérias do gênero Paenibacillus sp. mostrou que quando alimentadas com açúcar e nutrientes em abundância (no laboratório), elas comem descontroladamente e começam a se reproduzir em uma velocidade absurda. O problema é que a digestão de todos esses carboidratos tem efeitos colaterais.

Um resquício ácido das reações químicas que ocorrem no interior das bactérias logo começa a se acumular — é como se elas nadassem em suas próprias fezes, já que são culturas isoladas em laboratório. O pH ácido torna o ambiente inóspito para as próprias bactérias e, em menos de 24 horas, todos os micro-organismos estão mortos.

A única forma encontrada pelos cientistas de evitar o ecocídio foi aplicar um composto que absorve o ácido (um tampão). Uma pequena parte de tampão mantém as bactérias vivas por 48 horas, ao passo que a quantidade necessária para evitar completamente a acidificação do meio permite que as bactérias continuem vivas, caso em que param de crescer quando acaba o alimento, mas não morrem. Em outros testes, foi constatado que, com menos oferta de alimento, as bactérias entram em hibernação quando acaba a comida, mas continuam vivas, já que não chegam a produzir ácido suficiente para o seu suicídio.

Parece contraditório, mas os resultados da pesquisa apontam que piorando as condições de vida das bactérias é possível salvá-las do ecocídio. O estudo, publicado na Revista Nature, indica ainda que o fenômeno do suicídio ecológico não é raro mesmo em bactérias que vivem no solo. Os pesquisadores descobriram que ele ocorre em 25% das 118 espécies analisadas.

Embora seres humanos e bactérias sejam grupos muito diferentes, a pergunta que fica é: será que, como as bactérias, estamos consumindo os recursos naturais disponíveis muito rápido e deixando um rastro de destruição que pode acabar destruindo as condições mínimas das quais precisamos para sobreviver? Restringir algumas das “vantagens” do mundo moderno, como consumo de alimentos de origem agropecuária, embalagens e produtos dos mais variados tipos de plástico (que acabam nos mares), veículos movidos por combustíveis fósseis e até mesmo os alimentos ultraprocessados que comemos, pode ser uma boa ideia para manter o nosso ecossistema limpo? Que tal começarmos pelo consumo consciente?

Crime de ecocídio

Comumente, ecocídio é definido como “a destruição sistemática do meio ambiente” ou se refere, basicamente, ao ato de matar o meio ambiente. Sob essa ótica, o ecocídio seria um crime contra a natureza.

Esse debate ganhou forças em 2019 quando o embaixador de Vanuatu na União Europeia sugeriu que a destruição do meio ambiente se tornasse um crime. Vanuatu é um pequeno estado insular no Pacífico Sul que enfrenta os efeitos da crise climática. No entanto, as ações que provocaram o aumento das temperaturas não aconteceram inteiramente nesse estado. Por isso, o embaixador sugere uma medida internacional.

A jurisdição atual do Tribunal Penal Internacional permite que se processe quatro crimes: genocído, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes de agressão. Em contrapartida, ativistas ambientais defendem que, se é um crime, não deve ficar impune e que, enquanto não houver leis, a destruição ambiental em massa continuará.

Os ativistas acreditam que o crime de ecocídio deve se aplicar aos danos mais graves, abrangendo atividades como derramamento de óleo, mineração em alto mar, pecuária industrial e extração de areia de alcatrão. Os advogados apontam, no entanto, que uma lei internacional sobre ecocídio seria difícil do ponto de vista legal. Há muitas partes do processo criminal que seriam complicadas.

Para isso, os ativistas da campanha Stop Ecocide reuniram um painel dos principais advogados internacionais para escrever uma definição “clara e juridicamente robusta”. O grupo já recebeu apoio de alguns países e segue buscando outros apoios políticos.




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