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O gás natural faz parte das estratégias de transição energética dos países. Mas esse gás de origem fóssil não deve ser considerado como fonte limpa, segundo estudo da rede C40. A recomendação é que os países se planejem para retirá-lo de suas matrizes energéticas o mais cedo possível, direcionando investimentos para fontes renováveis e para eficiência energética

Por Fernanda Macedo em Página 22 | Apesar de popularmente conhecido como “gás natural”, o gás fóssil não pode ser considerado uma fonte de energia verde, nem limpa. Este é um alerta do novo estudo da C40 – Liderança Climática, rede que reúne prefeitos e profissionais de grandes cidades em todo o mundo para combater a mudança do clima. O alerta torna-se ainda mais relevante após a COP 27 (Conferência do Clima realizada no Egito, em novembro de 2022).

O texto final das negociações  deixou uma brecha para que o gás faça parte das estratégias de transição energética dos países, justamente por ser erroneamente considerado uma fonte de energia limpa. Atualmente, é responsável por 20% das emissões mundiais de Gases de Efeito Estufa (GEE) relacionadas à energia.

Isso acontece principalmente pelo vazamento de metano, um gás 20 vezes mais prejudicial ao clima do que o dióxido de carbono durante a extração, distribuição e o consumo do gás fóssil. Esses vazamentos são subcontabilizados nos inventários de GEE das empresas e dos países. Pesquisas recentes trazem diversas evidências de que esse vazamento neutraliza qualquer ganho que o gás fóssil teria em relação a outros combustíveis fósseis, como o carvão.

Fruto de um lobby do setor que há anos busca garantir espaço nas políticas públicas e nos planos de transição energética dos países, a boa reputação do gás fóssil tem sido desconstruída por estudos recentes que indicam impactos muito significativos para a saúde pública, a economia e o clima.

Nas cidades que fazem parte da rede C40, o gás fóssil é responsável por 10% da lacuna de emissões entre as atuais metas climáticas nacionais (NDC, na sigla em inglês) e a meta do Acordo de Paris de emissões líquidas zero até meados do século XXI. O estudo analisou o uso de gás fóssil em eletricidade, edifícios e indústrias nas 96 cidades da C40.

A poluição do ar por gás fóssil afeta a saúde nas cidades. Seu consumo causou 35.987 mortes prematuras em 2020 nas cidades da rede, 40.327 novos casos de asma em crianças e 3.317 nascimentos prematuros. A modelagem do estudo sugere que as NDCs atuais levariam a mais 217.045 mortes prematuras nesses municípios até 2035 e 776.190 até 2050.

Ajustar as NDCs  – para que elas façam a transição energética sem o gás fóssil e, dessa forma, consigam se manter na meta do Acordo de Paris – evitaria mais de US$ 3,9 trilhões em perdas econômicas acumuladas em saúde entre 2020 e 2050, segundo o estudo.

Além dos gastos com saúde pública, o consumo de gás fóssil traz prejuízos financeiros também aos investimentos de infraestrutura no setor. A demanda de mercado por esse combustível deve ser cada vez menor, em função dos compromissos climáticos assumidos no mundo. Assim, a infraestrutura construída corre o risco de não ser utilizada e se tornar um “elefante branco”. Alguns especialistas defendem que essa infraestrutura do gás fóssil poderia ser adaptada para o uso do hidrogênio como combustível. No entanto, ainda faltam estudos para confirmar a viabilidade, que hoje não é factível.

Segundo Mariana Nicoletti, gerente sênior de pesquisa da C40, fontes mais limpas como eólica e solar são mais baratas que o gás fóssil. “A geração de energia em novas usinas a gás fóssil já custa mais caro do que a energia solar e eólica em todos os países onde as cidades da C40 estão localizadas, com exceção de apenas um, incluindo grandes consumidores de gás fóssil, como Estados Unidos, União Europeia, Estados Unidos Reino, China e Canadá. O investimento em novas energias renováveis é um movimento em curso, que vem crescendo muito nos últimos anos e vai se acelerar.”

Há também um potencial de mais e melhores empregos ao apostar nas energias realmente renováveis, em detrimento do gás fóssil. O negócio de reforma de edifícios e instalação de telhados solares tem alto potencial de emprego. Nicoletti ressalta que investir US$ 1 milhão em energia solar e eólica em escala de utilidade pode criar 1,7 vezes a energia das usinas de gás fóssil. “Investir na modernização e em edifícios movidos a energia solar pode gerar seis vezes mais empregos do que o mesmo investimento em gás fóssil”, diz.

Mesmo com tantas evidências de que o gás fóssil não é o melhor caminho para o meio ambiente, a saúde e a economia, sua expansão parece pouco questionada. Na América Latina, o México aumentou sua meta da NDC de redução de emissões de GEE de 22% para 30% até 2030 e anunciou a construção do maior parque solar da região. No entanto, junto a esta central, serão instaladas duas usinas de ciclo combinado que são movidas a gás fóssil.

“O presidente Lula deixou claro durante a COP 27 que a descarbonização da economia do País é uma prioridade. Atualmente, os planos de expansão do gás no país triplicarão sua capacidade até 2035, quando deverá ser reduzida em 9% para atender ao limite no aumento da temperatura em 1,5 grau em relação aos níveis pré-industriais (meta do Acordo de Paris). Substituir o gás fóssil por renovável, especialmente em edifícios, para cozinhar e aquecimento de água, na geração de energia e também no setor de transporte, é um dos desafios do novo governo”, diz Nicoletti.

Segundo o estudo, os países têm investido e apostado no gás fóssil por duas razões. A primeira é a falta de conhecimento sobre os reais impactos, pois esses estudos são recentes. Mas o segundo e principal motivo é o lobby do gás.

Entre as recomendações do estudo, estão planos para que países com renda mais alta façam uma transição mais acelerada em suas NDCs para reduzir a dependência do gás fóssil. Já nos países de renda média ou baixa, reconhecendo responsabilidades históricas e capacidade de ação, o processo poderia seria mais gradual, como no caso do Brasil.

Mas a dependência do gás natural apenas aumenta a lacuna de emissões. “A principal conclusão do estudo é de que, para manter o limite de aumento de temperatura global em 1,5 grau, é fundamental que os países se planejem para tirar o gás fóssil de suas matrizes energéticas o mais cedo possível, direcionando investimentos para fontes renováveis e eficiência energética”, conclui Nicoletti.

Este texto foi originalmente publicado por Página 22 de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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