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Enquanto cientistas alertam para os limites do aquecimento global e ativistas exigem ações urgentes, parte da sociedade parece buscar refúgio em uma realidade paralela

Em um planeta assolado por ondas de calor recordes, enchentes devastadoras e previsões cada vez mais sombrias sobre o futuro da humanidade, um objeto aparentemente inocente ganha espaço nas prateleiras e no imaginário de milhares de pessoas: as bebês reborns, bonecas hiper-realistas que imitam recém-nascidos com impressionante precisão.

Vendidas como itens de colecionador, terapias para luto ou substitutos emocionais para quem não pode (ou não quer) ter filhos, essas bonecas levantam uma questão incômoda: será que sua popularidade reflete não apenas desejos individuais, mas também um medo coletivo do que está por vir?  


A boneca e o vazio do futuro

Não é difícil entender o apelo das reborns. Elas choram, respiram, têm veias visíveis sob a pele de silicone e podem ser vestidas, alimentadas (simbolicamente) e embaladas como bebês de verdade. Para muitas mulheres, representam a chance de vivenciar uma maternidade sem riscos, sem custos exorbitantes e, principalmente, sem o peso de trazer uma criança a um mundo em crise.  


Enquanto cientistas alertam para os limites do aquecimento global e ativistas exigem ações urgentes, parte da sociedade parece buscar refúgio em uma realidade paralela—uma onde a maternidade é controlável, limpa e livre das angústias da crise climática. Afinal, uma boneca não sofrerá com a escassez de água, não precisará fugir de incêndios florestais e não herdará um planeta à beira do colapso ecológico.  


O paradoxo do consumo “inocente”

 Mas há uma ironia cruel nesse fenômeno. Enquanto algumas mulheres abrem mão da maternidade real por preocupação ambiental, as *reborns* são, elas mesmas, produtos de uma indústria que depende de plástico, tintas sintéticas e transporte globalizado—todos vinculados à economia fóssil que alimenta a crise climática.

Compra-se o simulacro de um bebê para evitar o impacto de um filho real, mas o consumo desses objetos ainda contribui, mesmo que minimamente, para o problema que se tenta evitar.  


Fuga ou adaptação?

 Não se trata de julgar quem busca conforto nas reborns, mas de questionar o que esse comportamento diz sobre nosso tempo. Vivemos uma era de eco-ansiedade, termo cunhado pelo filósofo Glenn Albrecht para descrever o mal-estar gerado pela degradação ambiental.

Se, para algumas pessoas, a resposta é o ativismo ou a adoção de um estilo de vida sustentável, para outras, a saída parece ser a construção de mundos particulares—seja através de bonecas, metaversos ou outras formas de substituição do real.  


Será essa uma fuga legítima ou um sintoma de que estamos desistindo de consertar o mundo? A resposta não é simples. Mas o crescimento das reborns como fenômeno cultural sugere que, diante de um futuro incerto, muitas pessoas preferem o consolo do controle ilusório à dura tarefa de enfrentar—e transformar—a realidade.  


Enquanto isso, o planeta continua a aquecer, e as bonecas seguem sendo vendidas, em silenciosa metáfora de um dilema que ainda não sabemos resolver.


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