Trabalho com estruturas porosas personalizáveis abre caminho para combater poluição e escassez de água
Um punhado de material com a capacidade de uma bolsa mágica de armazenar gases. Esta é a promessa das estruturas metal-orgânicas (MOFs, na sigla em inglês), cujo desenvolvimento rendeu o Prêmio Nobel de Química de 2025 a três pesquisadores. Susumu Kitagawa, Richard Robson e Omar Yaghi foram laureados por criar uma arquitetura molecular porosa que pode ser desenhada para capturar moléculas específicas da atmosfera ou de efluentes industriais. A capacidade de personalização é um dos trunfos da tecnologia. Os cientistas combinam nós de metal com hastes orgânicas para construir estruturas cristalinas repletas de cavidades de tamanhos definidos. O controle sobre a arquitetura permite que os poros sejam ajustados para reter seletivamente água, dióxido de carbono, metano ou outros compostos.
A pesquisa, que se estende por décadas, começou com os trabalhos pioneiros de Richard Robson na Universidade de Melbourne, na Austrália, nos anos 1980. Robson, hoje com 88 anos, demonstrou a possibilidade de criar uma estrutura ordenada e esponjosa, embora inicialmente instável. As contribuições fundamentais de Susumu Kitagawa, de 74 anos, da Universidade de Kyoto, e de Omar Yaghi, de 60 anos, da Universidade da Califórnia em Berkeley, solidificaram o campo. Kitagawa provou que os gases poderiam fluir para dentro e para fora das estruturas, enquanto Yaghi criou um MOF notavelmente estável e mostrou que suas propriedades poderiam ser racionalmente desenhadas.
As aplicações potenciais desses materiais se estendem a diversas frentes. Cientistas investigam seu uso para remover gases de efeito estufa diretamente da atmosfera e para capturar poluentes em locais industriais. Em ambientes áridos, as estruturas poderiam colher umidade do ar do deserto, uma possibilidade visionária para a obtenção de água potável. A medicina também se beneficia, com pesquisas sobre o carregamento dessas estruturas com medicamentos para liberação controlada no organismo, um método que poderia otimizar terapias como a quimioterapia.
A indústria já começou a adotar a tecnologia. Empresas utilizam as estruturas porosas em embalagens para frutas, onde liberam gradualmente substâncias que retardam o amadurecimento durante o transporte de longa distância. O comitê do Nobel comparou a capacidade de armazenamento dos MOFs à bolsa aparentemente sem fundo da personagem Hermione Granger, da série “Harry Potter”, ilustrando seu potencial extraordinário.
A transição do laboratório para o mundo real, no entanto, apresenta obstáculos. Muitos MOFs atingem sua máxima capacidade de armazenamento em condições de baixa temperatura e alta pressão, um desafio logístico e econômico para aplicações em larga escala. Apesar disso, o campo é vibrante, com dezenas de milhares de estruturas diferentes já sintetizadas por pesquisadores ao redor do globo.
O anúncio do prêmio pegou os laureados em momentos distintos. Yaghi recebeu a notícia durante uma escala no aeroporto de Frankfurt. Kitagawa, inicialmente cético, atendeu o telefone o pensando ser uma ligação de telemarketing. Já o octogenário Robson, em sua casa em Melbourne, declarou-se surpreso e feliz com a honraria, que chega em uma fase tardia de sua vida e carreira. O prêmio reconhece uma conquista científica e a abertura de um novo capítulo na química de materiais, com implicações profundas para o futuro do planeta.