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Segundo estudiosos, há boas informações e ferramentas para a restauração, mas falta governança

Imagem de coz07g por Pixabay

  • Pastagens ocupam 57 milhões de hectares do Cerrado, 29% do bioma, a savana mais rica em biodiversidade do mundo.
  • Estudo da Universidade de Brasília mostra que grande parte dessas pastagens degradadas tem alto potencial de regeneração.
  • A pesquisa identificou as áreas prioritárias para recuperação e indica caminhos possíveis que dependem de gestão para ser implementadas.
  • Com essas pastagens restauradas, não seria preciso nem um hectare a mais de desmatamento para manter a produção agropecuária e, ao mesmo tempo, conservar a biodiversidade.

Com mais de 50% da sua vegetação original destruída e com um desmatamento que avança mais rápido que na Amazônia, o Cerrado está em grave risco. Mas um estudo publicado pela Universidade de Brasília (UnB) mostra que o potencial de regeneração das pastagens, responsáveis por 29% do uso da terra no Cerrado – cerca de 57 milhões de hectares – é de intermediário para alto na maioria dos casos.

Esta é uma boa notícia tanto para a conservação e a regeneração do bioma, que é a savana mais biodiversa do mundo e fundamental para o abastecimento de água em todo o Brasil, quanto para a produção agropecuária. Mas nada irá acontecer sem vontade política e gestão aplicada com o conhecimento disponível.

O estudo, feito por Jéssica Schüler, orientada por Mercedes Bustamante, confirma que não é necessário sequer um hectare a mais de desmatamento e que é possível restaurar o Cerrado com as áreas prioritárias e mais aptas a essa renovação já identificadas. Escolhas (“trade-offs”) precisarão ser feitas, mas é possível conciliar os interesses de todos os envolvidos.

Para isso, no entanto, é preciso governança, destaca Bustamante, professora da UnB e uma das maiores referências em Cerrado.

“As ferramentas existem e podem ser aprimoradas. Hoje não dá para dizer que não tem informação. O que falta é governança. E a tomada de decisão com base na melhor informação disponível”, destaca Bustamante.

A análise elaborou um mapa de áreas prioritárias para a restauração de pastagens no Cerrado considerando ganhos para a biodiversidade, o potencial de regeneração natural e a aptidão agrícola.

Foram levados em conta a conectividade de habitat em diferentes áreas do bioma e índice de degradação de pastagens para identificar áreas com maior potencial de regeneração natural. Os resultados mostraram que 45% das pastagens têm potencial intermediário-baixo, 10% intermediário-alto e 1% alto.

Na prática, mais da metade das pastagens apresentam boa capacidade de restauração. Projetos adequados às distintas realidades locais do Cerrado, que ocupa 24% do território nacional, podem trazer benefícios a todos. Os desafios, porém, são muitos.

“A restauração do Cerrado é complicada por se tratar de um sistema complexo que leva tempo”, destaca Schüler. Mas é possível, com as informações já disponíveis, traçar um plano de ação. “É preciso pensar a própria produção de uma maneira mais inteligente; a tecnologia já existe”, afirma.

Menos burocracia e mais inteligência aplicada

Outro ponto é tentar equilibrar a distribuição geográfica desigual dos quadros de degradação e oportunidade para restauração. A maior parte das pastagens com alto potencial de regeneração está localizada na parte norte do Cerrado, na transição com a Amazônia, onde o déficit ambiental de Reserva Legal e as demandas de restauração não são tão dramáticas quanto na parte sul-oeste e centro do bioma, principalmente nos estados de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul.

Agir rápido é importante. Afinal, o Brasil possui tratados internacionais – como as metas firmadas no Acordo de Paris – e leis nacionais com esse objetivo. É o caso do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), publicado em 2017, que prevê a recuperação de 12 milhões de hectares em todo o país até 2030 e subsidia o cumprimento do Código Florestal, publicado em 2012.

Neste cenário, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) é uma ferramenta importante. O CAR é um registro obrigatório e autodeclaratório das propriedades rurais que deve conter os limites georeferenciados  de Reserva Legal (de 20% a 35% da propriedade no Cerrado), APPs (Áreas de Preservação Permanente), áreas de uso restrito e áreas desmatadas antes de 2008.

Afinal, todo desmatamento tem que ser autorizado pelos órgãos responsáveis, lembra Bustamante, e é necessário levar vários pontos em conta. Se o órgão ambiental tem a ferramenta, consegue mapear os dados e avaliar a localização da bacia hidrográfica, o tamanho da propriedade e outros fatores, é possível negociar uma autorização condicionada a certos termos.

Por exemplo, obrigando os proprietários a mudar a configuração da sua Reserva Legal, criando uma conexão com a RL do vizinho e, por consequência, um corredor ecológico de área protegida. “Esses processos de autorização de supressão de vegetação têm que deixar de ser algo meramente burocrático, que foi isso que se tornou”, critica Bustamante.

É assim, em tese, que o déficit de 4,6 milhões de hectares de Reserva Legal no Cerrado pode ser resolvido com os 6,3 milhões de hectares de pastagem com maior potencial de regeneração, de acordo com o estudo.

Diversidade genética e soluções locais

As sementes também têm papel fundamental na regeneração das pastagens degradadas. E o Cerrado possui uma variedade enorme de gramíneas nativas, explica Schüler. A maioria dessas sementes são espalhadas por aves e mamíferos como o lobo-guará.

“As gramíneas no Cerrado são importantíssimas para serviços ecossistêmicos e a produção de pecuária sobre capim nativo, uma alternativa bem mais sustentável do que pastagem plantada”, conta a pesquisadora.

Para entender melhor a dinâmica da regeneração natural no Cerrado e ver a precisão das técnicas de sensoriamento remoto, Schüler conduziu uma avaliação de campo na Floresta Nacional de Brasília com base em dados do projeto MapBiomas.

O estudo também avaliou o potencial de regeneração em quatro ecorregiões diferentes do Cerrado: Basaltos do Paraná (PR/SP/MG), Planalto Central (GO/MG), Alto São Francisco (MG) e Depressão Cárstica do São Francisco (MG/BA/PI).

A lição é de que é fundamental levar em conta a diversidade local das diferentes regiões do bioma. Ou seja, a técnica de restauração no Distrito Federal será diferente de regiões perto da Caatinga ou da Amazônia, com cenários climáticos distintos.

“É preciso considerar essa heterogeneidade espacial, pelo tamanho e complexidade do Cerrado. Desconsiderar isso quando se vai restaurar e proteger não faz sentido”, finaliza Schüler.

O projeto no qual a pesquisa está inserida considera o nexo entre segurança hídrica, energética e alimentar e as comunidades tradicionais, buscando uma abordagem integrada para o Cerrado. O próximo objetivo é entender melhor a influência do fogo na regeneração e nas dinâmicas do clima. O pedido é para que o prazo de conclusão seja estendido pelo menos até o fim de 2021 pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


Fonte: Mongabay – Licenciado sob Creative Commons Attribution-NoDerivatives 4.0 International License.


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