Loja
Apoio: Roche

Saiba onde descartar seus resíduos

Verifique o campo
Inserir um CEP válido
Verifique o campo

Exame desenvolvido pela startup BiDiagnostics com apoio do PIPE-FAPESP promete diagnóstico mais rápido e preciso de micose profunda causadora de feridas graves e potencialmente fatais em gatos domésticos

Por Fábio de Castro  em  Pesquisa para Inovação – Nos últimos anos começaram a se multiplicar os casos de uma doença dermatológica em gatos, chamada esporotricose, causada por fungos do gênero Sporothrix sp. Uma micose profunda, que produz lesões na pele, a doença é transmitida a seres humanos por arranhaduras ou mordeduras de gatos domésticos infectados.

A fim de facilitar a detecção, a startup BioInsumos e Diagnósticos(BiDiagnostics) desenvolveu, com apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, um novo teste rápido para diagnóstico da doença em gatos.

O novo teste identifica nos animais a esporotricose transmitida pela espécie Sporothrix brasiliensis, responsável pela forma mais prevalente e virulenta da doença, cujos casos têm se multiplicado nos últimos anos a ponto de ser considerada pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) como uma hiperendemia zoonótica na América do Sul. A empresa já havia desenvolvido, também com apoio do PIPE-FAPESP, um teste para a detecção da doença em humanos.

Com um método minimamente invasivo, o teste garante um diagnóstico mais rápido e preciso da esporotricose e poderá ser utilizado diretamente nos consultórios veterinários para triagem diagnóstica, acelerando o tratamento e melhorando as chances de cura. Embora não cause lesões severas em humanos, nos gatos a doença costuma produzir feridas graves e potencialmente fatais.

De acordo com a geneticista Maria Griselda Perona, responsável pela área de pesquisa e desenvolvimento da BiDiagnostics, até o momento não existem ferramentas diagnósticas para a esporotricose felina que possam ser diretamente utilizadas pelo médico veterinário no consultório.

“Nosso primeiro projeto teve foco no desenvolvimento de um teste laboratorial para humanos e o segundo no teste rápido aplicado em gatos. O principal diferencial de ambos é o antígeno que dá especificidade para detecção do S. brasiliensis, a principal espécie patogênica. O objetivo agora é transformar o teste – para humanos e para animais – em produtos que serão pioneiros no mercado brasileiro”, afirma Perona.

Segundo a pesquisadora, no primeiro projeto PIPE-FAPESP a empresa obteve a prova de conceito para o teste do tipo ELISA aplicado a humanos e desenvolveu uma adaptação do teste para felinos. No segundo projeto PIPE-FAPESP, encerrado no fim de novembro, o teste sorológico felino foi revalidado e foi transposto para um piloto do teste rápido aplicado em animais, dentro do conceito conhecido como Point of Care (POC).

“O conceito POC é uma tendência mundial e se refere ao teste aplicado na ponta, isto é, no consultório do veterinário. O nosso teste permite que o profissional realize o diagnóstico em 15 minutos, para uma triagem dos felinos com suspeita de esporotricose. Isso reduz custos, simplifica a logística e diminui o tempo de diagnóstico”, explica.

Segundo a pesquisadora, atualmente a cultura micológica é o método utilizado para testar animais com suspeita de esporotricose. O médico veterinário faz a coleta de material por meio de swab (cotonete) e envia para cultivo em laboratório a fim de identificar o fungo.

A taxa de falsos negativos, porém, é alta, porque o fungo pode eventualmente não estar concentrado na região da coleta. “O que propusemos é um teste sorológico que não irá substituir as ferramentas diagnósticas, mas irá se somar a elas, de modo a aumentar a certeza do diagnóstico do animal”, diz Perona.

“Entendemos que os testes que desenvolvemos, para humanos e animais, são duas faces da mesma moeda e que seria mais proveitoso trabalhar simultaneamente com ambos. Nosso foco agora é passar para outro patamar tecnológico, em ambos os testes”, diz.

De acordo com ela, a próxima fase envolverá avaliação de viabilidade, adaptações para a produção industrial, registro em agências regulatórias e outros requisitos que permitirão levar ambos os testes à esteira de produção. A pesquisadora explica que, embora tenham dois mercados distintos, os testes para humanos e felinos têm uma base comum, utilizando princípios ativos muito similares.

Embora ainda não esteja no mercado, o teste ELISA para humanos, desenvolvido no primeiro projeto, foi tão bem-sucedido que já é oferecido pela empresa, por meio de uma parceria com o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Imunocromatografia

Segundo Perona, desde o primeiro projeto os pesquisadores já tinham em mente o desenvolvimento do teste em felinos, mas a ideia esbarrava em um problema prático, que foi identificado em 2019, quando eles participaram do 12º Treinamento PIPE em Empreendedorismo de Alta Tecnologia, oferecido pela FAPESP, e realizaram 105 entrevistas com potenciais interessados na tecnologia (leia mais em https://pesquisaparainovacao.fapesp.br/1190).

“Os veterinários com quem conversamos manifestaram a preocupação com a manipulação dos felinos no momento de extrair a amostra de sangue necessária para fazer o teste, em uma situação de estresse para o animal no consultório. Para um teste sorológico é preciso extrair cerca de 1 mililitro de soro do sangue do animal – uma pequena quantidade, mas que representa um grande problema prático”, diz.

Os pesquisadores superaram o problema no segundo projeto, criando o teste rápido que, com uma única gota de sangue, permite uma resposta qualitativa, isto é, que indica se o animal está infectado ou não. “Para detectar os antígenos, utilizamos imunocromatografia, uma técnica de separação. Como nos testes de gravidez, utiliza-se uma tirinha de papel, que é uma membrana especial. Com uma gota de sangue, é possível detectar o anticorpo resultante da presença do fungo S. brasiliensis”, afirma.

O diagnóstico diferencial é extremamente importante no caso da esporotricose. Os sintomas são facilmente confundidos com os de outras lesões na pele, incluindo aquelas provocadas por brigas e maus-tratos. “Com essa confusão frequente, é comum que o animal seja tratado topicamente e não apresente melhora. Quando se chega ao diagnóstico, o tratamento é mais difícil e o animal muitas vezes já contaminou outros gatos e pessoas”, diz.

Segundo a pesquisadora, em 2019 a OPAS emitiu um alerta de que há casos de esporotricose causada por S. brasiliensis na Argentina, Paraguai, Bolívia e Colômbia. Como em nem todos os lugares a doença é de notificação compulsória, é provável que os dados oficiais de número de casos estejam subestimados.

“Existe uma série de características que fizeram com que o patógeno se adaptasse às condições, por seleção natural, a ponto de produzirem uma hiperendemia”, explica Perona.

Baixa gravidade em humanos

De acordo com a pesquisadora, o primeiro caso de esporotricose em felinos no Brasil foi descrito na década de 1950, mas até 2015 a doença foi atribuída erroneamente à espécie Sporothrix schenckii.

“A S. brasiliensis foi descrita em 2007, mas só em 2015 se confirmou que ela era a responsável pela transmissão da doença”, diz.

Boletins epidemiológicos recentes registraram de centenas a milhares de casos humanos, com crescimento exponencial do número de pacientes por ano. Em gatos, segundo Perona, a doença alastra-se pelo Brasil sem qualquer perspectiva de controle epidemiológico. Os casos notificados no Rio de Janeiro em 2019, por exemplo, atingiram até 10% da população felina da cidade. Estima-se uma população de quase 24 milhões de gatos domésticos no Brasil.

Na maior parte dos casos, de acordo com a pesquisadora, a doença em gatos é tratável e curável. Mas o tratamento, com um antifúngico, pode ser longo. “Dura no mínimo três a quatro meses, podendo chegar a um ano. Não é algo trivial dar o medicamento ao gato, mas é possível curá-lo. Quanto antes o tratamento é iniciado, melhor o prognóstico. Por isso é tão importante ter um diagnóstico preciso e precoce”, sublinha.

Em humanos, em geral, a doença não é tão grave, mas pode produzir feridas em um único lugar do corpo ou em diversas partes espalhadas por áreas associadas ao sistema linfático. “Segundo os relatos da literatura, os humanos não podem transmitir a doença. Mas o gato, além de ficar doente, transmite para outros animais e pessoas”, compara Perona.

Este texto foi originalmente publicado por Pesquisa para Inovação FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original.


Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos. Saiba mais