Animais são capazes de transformar metilmercúrio em forma menos tóxica, reduzindo riscos à saúde e ao meio ambiente
A contaminação por mercúrio nos rios e oceanos representa uma ameaça silenciosa, acumulando-se nos tecidos de peixes e, consequentemente, nos seres humanos que os consomem. Pesquisadores da Macquarie University, na Austrália, desenvolveram uma solução inovadora: peixes-zebra e moscas-da-fruta geneticamente modificados para converter metilmercúrio, a forma mais tóxica do metal, em mercúrio elementar, menos prejudicial e que pode ser eliminado como gás.
O estudo, publicado na Nature Communications, revelou que os peixes modificados apresentaram 64% menos mercúrio em seus corpos, enquanto as moscas tiveram uma redução de 83%. A técnica utiliza genes da bactéria Escherichia coli, responsáveis por produzir enzimas que transformam o poluente. A proposta é que esses organismos possam atuar como filtros vivos, protegendo predadores maiores—incluindo humanos—dos efeitos nocivos do mercúrio, que afeta o sistema nervoso e a saúde reprodutiva.
Robert Mason, especialista em sistemas aquáticos da Universidade de Connecticut, ressalta que a abordagem pode ser eficaz em escala local, mas alerta para um desafio: o mercúrio elementar liberado no ar pode reconverter-se em sua forma tóxica. Em instalações controladas, como as que utilizam insetos para processar resíduos orgânicos, filtros poderiam capturar o poluente. No caso de peixes, no entanto, a solução exigiria maior controle.
A equipe liderada por Kate Tepper sugere que os peixes modificados sejam introduzidos em áreas críticas, como regiões de garimpo artesanal na Amazônia, África e Indonésia, onde a contaminação por mercúrio é alta e comunidades dependem da pesca para subsistência. Antes disso, porém, serão necessários testes rigorosos para evitar impactos ecológicos imprevistos, como a liberação acidental de organismos transgênicos no meio ambiente.
A pesquisa abre caminho para aplicações futuras, como o uso de animais geneticamente editados no combate a outros poluentes, incluindo microplásticos e substâncias industriais persistentes. Apesar dos avanços, os cientistas destacam que a técnica ainda demanda anos de estudo antes de ser implementada em larga escala. Enquanto isso, a busca por soluções sustentáveis contra a poluição por mercúrio continua urgente.