Vírus, bactérias e fungos adormecidos por milênios poderão despertar com derretimento de geleiras

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Por Rodrigo Vargas – Observatório do Clima | O derretimento acelerado de geleiras em razão do aquecimento global poderá criar condições para o despertar de bactérias, fungos e vírus adormecidos por milhares de anos, alguns deles patógenos, ou seja, capazes de infectar plantas e animais, incluindo humanos.

O tema ocupa um capítulo inteiro do relatório “O Peso do Tempo: enfrentando uma nova era de desafios para as pessoas e os ecossistemas”, lançado nesta semana pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). 

De acordo com o documento, a crise climática está afetando pesadamente as regiões que compõem a chamada criosfera, onde há neve, geleiras permanentes e solos congelados sazonalmente. 

O Ártico, a Antártida e a Groenlândia, por exemplo, fazem parte desse ecossistema que cobre 52% da superfície terrestre do planeta e 5% de sua área oceânica. Segundo o relatório, essas regiões vêm sofrendo “danos substanciais e perdas irreversíveis”. 

“Projeções indicam que entre 24% e 69% do permafrost [o subsolo permanentemente congelado do Ártico] próximo à superfície do planeta descongelará até 2100”, alerta o documento.

Entre as muitas consequências devastadoras desse cenário está a possibilidade de que sejam retirados do confinamento no gelo uma quantidade enorme de microrganismos, dentre os quais bactérias, fungos microscópicos, protistas, arqueas unicelulares e vírus. 

“Devido às condições ambientais adversas predominantes, a maioria dos micróbios congelados está morta. No entanto, alguns estão metabolicamente ativos e se multiplicam lentamente, enquanto muitos outros estão dormentes, mas ainda viáveis, o que significa que podem se multiplicar em taxas normais quando as condições permitem.”

Em ambientes controlados, segundo o documento, pesquisadores conseguiram reativar organismos que se mantiveram em estado dormente por milhares de anos.

“Microrganismos eucarióticos, como fungos, algas e protistas, foram reativados de gelo antigo de até 50.000 anos. Vírus preservados no permafrost por até 48.500 anos também foram reativados em laboratório, conseguindo infectar hospedeiros e se multiplicar”, relatam os autores.

A possibilidade de surtos generalizados decorrentes do agravamento deste cenário é descrita como “improvável”, mas os pesquisadores admitem que ainda é preciso aprimorar os instrumentos para medir essa ameaça.

“Mesmo que o derretimento possa ser desacelerado pela redução das emissões de gases de efeito estufa, devemos avaliar e nos preparar para possíveis ameaças de patógenos potenciais”, escreveu Inger Andersen, diretora executiva do PNUMA, em trecho do texto de abertura do relatório.

Para reduzir as perdas na criosfera, o documento defende a redução das emissões de gases de efeito estufa (incluindo as emissões de carbono provenientes de motores a diesel, queimadas agrícolas a céu aberto e incêndios florestais) e a limitação do turismo em regiões congeladas e frágeis. É recomendado, ainda, mais investimento em pesquisa sobre a diversidade de microrganismos nessas regiões.

Este texto foi originalmente publicado pelo Observatório do Clima, de acordo com a licença CC BY-SA 4.0. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.

Bruna Chicano

Cientista ambiental, vegana, mãe da Amora e da Nina. Adora caminhar sem pressa e subir montanhas.

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