Vida em zoológicos e centros de pesquisa altera profundamente microbiota intestinal de ursos e pandas, revela estudo

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A vida entre grades e recintos cobra um preço silencioso da saúde de espécies ameaçadas. Uma investigação científica recente expõe que o cativeiro é o principal fator de transformação do microbioma intestinal de pandas-gigantes, pandas-vermelhos e ursos-negros-asiáticos. Essas alterações, que superam a influência da dieta e da genética, podem comprometer a capacidade desses animais de se readaptarem à vida selvagem.

A pesquisa, publicada na revista PLOS One, analisou amostras fecais de animais selvagens e cativos. A técnica de sequenciamento genético 16S rRNA V4 permitiu mapear a comunidade bacteriana presente nos intestinos de cada grupo. A análise estatística dos dados, incluindo a ferramenta PERMANOVA, atribuiu um peso a cada variável. O ambiente de cativeiro foi responsável por 21,6% das mudanças na estrutura microbiana, um impacto consideravelmente maior do que a linhagem do animal (12,3%) ou sua alimentação (3,9%).

Um dos fenômenos observados foi uma homogenização da microbiota intestinal. Espécies que possuem microbiomas distintos na natureza apresentam comunidades bacterianas mais similares quando confinadas. Paralelamente, registrou-se uma inversão na dominância de tipos de bactéria. Enquanto os animais selvagens são dominados por proteobactérias, especializadas em quebrar fibras vegetais complexas, os indivíduos em cativeiro apresentam maior predominância de firmicutes, bactérias associadas à fermentação de amidos e açúcares, comuns em dietas artificiais.

As consequências dessas mudanças variam entre as espécies. Para o panda-gigante, essencialmente herbívoro, a substituição de sua dieta selvagem de bambu resulta em uma perda significativa da diversidade microbiana. Por outro lado, pandas-vermelhos e ursos-negros-asiáticos, por serem onívoros, veem sua diversidade bacteriana aumentar com a dieta mista fornecida em cativeiro.

O estudo identificou ainda um aumento na presença de bactérias potencialmente patogênicas, como Streptococcus e Escherichia–Shigella, nos grupos cativos. A perda de microrganismos funcionais associados à vida selvagem e a proliferação de oportunistas pode minar a condição física do animal após sua soltura.

Os resultados soam como um alerta para estratégias de conservação. Programas que visam reintroduzir animais nascidos em cativeiro podem estar liberando indivíduos com deficiências digestivas e maior susceptibilidade a doenças. Especialistas defendem a urgência de melhorar as condições de cativeiro e explorar intervenções como o uso de probióticos ou transplantes fecais para restaurar uma microbiota mais próxima da selvagem antes da soltura.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)

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