Willians Gomes, fotógrafo, criador do sistema de filtragem de boias na foz do rio Piracanga | Foto: Nilmar Lage / Greenpeace
Por Tais Terra – Greenpeace | Em agosto de 2019, o litoral do Nordeste brasileiro foi palco de um dos maiores desastres ambientais já registrados na costa do país. Um derramamento de petróleo que, além de destruir ecossistemas e impactar a vida de milhares de pessoas, revelou o despreparo e a inação das autoridades diante de uma crise de tamanha magnitude.
Seis anos depois, o impacto desse crime ambiental ainda é sentido nas praias, nos manguezais e, sobretudo, nas comunidades que dependem desses ambientes para sobreviver. O óleo se infiltrou na lama, nas raízes, no corpo e na memória coletiva.
“E assim, foi um momento difícil e a participação maciça da comunidade contou muito a favor. A gente conseguiu não fazer 100%, mas 80% da mancha foi contida antes de chegar às praias. A comunidade está de parabéns, principalmente as mulheres pelo trabalho feito naquele momento de desespero, quando vimos nossas praias contaminadas por uma coisa estranha que nunca tínhamos visto na vida” — Gileno Nascimento, pescador do Baixo sul da Bahia.
Enquanto os números oficiais falam em mais de 5 mil toneladas de petróleo retiradas e 3 mil km de costa atingida, nenhuma empresa ou responsável foi punido.
Para além do dano ambiental, os impactos à saúde seguem invisibilizados. Pescadores e marisqueiras que entraram em contato direto com o óleo relatam alergias, problemas respiratórios e adoecimento mental.
“Na saúde eu me sinto fragilizado desde 2019, por ter tido contato direto com o petróleo. Nenhum pescador ou pescadora recebeu acompanhamento das secretarias municipais, ou estaduais para entender as consequências na saúde de quem vive da pesca artesanal” — Gileno.
A ausência de políticas de compensação levou famílias a abandonar a pesca e buscar outras atividades. As mulheres marisqueiras foram particularmente afetadas, com queda drástica de renda e ameaça à segurança alimentar.
“Quem teve contato com o petróleo cru não teve acompanhamento. Até hoje não existe monitoramento da saúde dessas pessoas. Muitos relatam problemas de pele, visão, alergias, além da ansiedade e depressão que se agravaram com a falta de respostas e a impunidade” — Andréa Rocha, coordenadora da campanha Mar de Luta.
Desde 2019, pescadores e pescadoras assumiram o protagonismo na limpeza, na denúncia e na organização coletiva. Essa mobilização se tornou a semente da campanha Mar de Luta, lançada oficialmente em 2020, que segue articulando comunidades contra a exploração de petróleo.
“A campanha nasce desse processo de denúncia, mobilização e resistência. Desde o início, nosso objetivo é reivindicar justiça socioambiental e lutar contra a expansão da indústria do petróleo nos territórios pesqueiros” — Andréa Rocha.
Para os membros da campanha Mar de Luta, justiça só virá com um processo de reparação integral, que contemple:
“O que nós desejamos como reparação é a punição dos culpados, simplesmente isso. Que a justiça seja feita para que crimes como esse não voltem a acontecer. E a garantia disso é clara: não pode haver mais nenhum poço perfurado” — Gileno.
Enquanto o Nordeste ainda luta pelas marcas de 2019, um novo risco paira sobre a costa brasileira: a tentativa de liberar a exploração de petróleo na região da Foz do Amazonas. Pesquisas do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA) mostram que um derramamento na região poderia se espalhar rapidamente por Guiana Francesa, Suriname, Guiana e até o Caribe.
“A reparação integral precisa vir acompanhada do compromisso de não ampliar a exploração de petróleo. É preciso proteger os territórios e fortalecer as economias sustentáveis que já existem” — Andréa Rocha, coordenadora da campanha Mar de Luta.
O cenário de incerteza não está apenas relacionado ao passado. Ele se projeta no futuro, onde comunidades pesqueiras seguem ameaçadas por novos empreendimentos e pela continuidade da política de expansão do petróleo.
“Olhando pra frente ficou o medo de que aconteça novamente e nada seja feito e ninguém seja punido, como até hoje ninguém foi. Fica essa interrogação no ar: será que amanhã não vai acontecer novamente e passaremos pela mesma coisa ou pior?” — Jadeir Regina, pescadora e presidenta da Colônia Z-15 de Maxaranguape (RN).
Seis anos depois, o crime do petróleo no Nordeste segue sem reparação. Mas a memória das comunidades e a resistência dos povos das águas mantêm a luta viva.
Não esquecemos. Não toleramos. Seguimos em luta.
Sua voz é essencial: Assine a petição e diga não ao petróleo na Amazônia.
Este texto foi originalmente publicado pelo Greenpeace, de acordo com a licença CC BY-SA 4.0. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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