Imagem de Aleksandra Boguslawska no Unsplash
A elevação do nível do mar, impulsionada pela crise climática, coloca pequenos Estados insulares diante de um cenário catastrófico: a possibilidade real de verem seu território completamente submerso. Esta ameaça existencial levanta uma questão urgente e inédita no campo do direito internacional: o que acontece com o status de um país quando sua base física literalmente desaparece?
Nações como Tuvalu, Kiribati, Maldivas e Ilhas Marshall enfrentam a erosão de seu solo, a salinização de suas fontes de água doce e a destruição de infraestruturas por eventos climáticos extremos. O risco de se tornarem inabitáveis ou de sumirem do mapa é uma projeção sombria, mas plausível, para este século. O desaparecimento do território e a eventual dispersão de sua população colocam em risco os pilares que definem um Estado soberano.
O direito internacional estabelece quatro elementos fundamentais para a existência de um Estado: uma população permanente, um território definido, um governo efetivo e a capacidade de se relacionar com outras nações. A submersão de um arquipélago ameaça eliminar todos esses componentes de uma só vez. No entanto, a lei internacional também demonstra flexibilidade em casos de Estados falidos, que mantêm seu reconhecimento mesmo sem um governo operante.
Recentemente, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) emitiu uma opinião consultiva sobre as obrigações climáticas dos Estados. O tribunal reconheceu que a crise climática representa uma ameaça à existência de pequenas ilhas e nações costeiras. Sobre o delicado tema da continuidade da statehood, a Corte afirmou que o desaparecimento de um elemento constituinte “não implica necessariamente” a perda do status de Estado. Contudo, a declaração foi considerada vaga e não ofereceu a garantia definitiva que essas nações esperavam.
Diante da incerteza legal, os países ameaçados estão tomando medidas concretas para assegurar seu futuro. Tuvalu firmou um tratado histórico com a Austrália, no qual Canberra se compromete a reconhecer sua statehood “independentemente do impacto da elevação do nível do mar”. O acordo ainda prevê um caminho para a migração de cidadãos tuvaluanos.
Paralelamente, Tuvalu embarcou em um projeto ambicioso de se tornar a primeira nação digital do mundo. A iniciativa envolve a digitalização de serviços governamentais, a recriação virtual de suas ilhas e o arquivamento de sua cultura e história, assegurando uma continuidade não-física da nação. Outras soluções, como projetos de engenharia para elevar artificialmente as ilhas Maldivas, também estão em teste.
Iniciativas multilaterais, como a Rising Nations Initiative, buscam mobilizar a comunidade internacional para proteger a soberania e os direitos desses países. A perda do status de Estado traria consequências devastadoras, incluindo a exclusão de organizações internacionais, a perda de controle sobre vastas zonas econômicas exclusivas no oceano e, o mais grave, a negação de uma identidade nacional e cultural a um povo que já teria perdido seu lar.
O direito internacional, portanto, é desafiado a evoluir rapidamente. É imperativo que a comunidade global desenvolva um marco jurídico sólido que proteja a soberania dessas nações, garanta os direitos de suas populações e responsabilize os maiores emissores de gases de efeito estufa pelas perdas e danos já irreversíveis. O destino desses países é um teste decisivo para a capacidade de resposta da governança global à crise climática.
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