Foto de Cristian Palmer no Unsplash
Por Tais Terra – Greenpeace | A distância média da Terra à Lua é de aproximadamente 384.400 km, e mesmo sendo tão longe de nosso planeta azul, o ser humano conhece mais a superfície da Lua do que o mar profundo.
Essa afirmação acaba de ganhar uma base científica ainda mais chocante por meio do estudo publicado na revista Science Advances, que demonstrou que a humanidade observou visualmente apenas 0,001% do fundo do mar em profundidades superiores a 200 metros, uma parcela minúscula, menor que o território do Distrito Federal. E esse número ainda pode estar superestimado.
A maior parte dessas imagens foi obtida em apenas três países: Estados Unidos, Japão e Nova Zelândia. Nas águas brasileiras, por exemplo, foram realizados apenas 135 mergulhos em profundidade superior a 200 metros, todos liderados por embarcações e equipes estrangeiras. Ou seja:
Esse dado é alarmante, especialmente diante das ameaças que pairam sobre essas regiões, como a mineração em águas profundas. Uma indústria desastrosa e perigosa, que tenta expandir mesmo sem que a ciência tenha informações mínimas sobre os ecossistemas que estariam em risco.
O “mar profundo” é tudo o que está além dos 200 metros de profundidade no oceano, uma zona que cobre mais da metade do planeta e abriga ecossistemas únicos, frágeis e ainda amplamente desconhecidos. Tudo que é mar profundo e está além das fronteiras dos países é patrimônio da humanidade. E mal sabemos o que tem lá.
Segundo o estudo liderado pela Ocean Discovery League, captar imagens nessas profundezas é caro, processual e tecnologicamente restrito a poucos países.
Para Mariana Andrade, Coordenadora do Greenpeace Brasil, nosso país precisa reconhecer a potência e a vulnerabilidade do seu próprio oceano.
Sem ciência, governamos o mar profundo às cegas. Decisões diplomáticas precisam estar ancoradas em dados e pesquisa para garantir que a biodiversidade das grandes profundidades, que sustenta nossa própria vida, seja protegida antes que desapareça sem sequer ser conhecida.
Mesmo com tão poucos registros, o que já foi visto é suficiente para mostrar que o oceano profundo é o lar de uma biodiversidade extraordinária, que conecta os mais profundos cantos do planeta à vida aqui no continente.
Habita as regiões de fundo arenoso e lamacento do Atlântico Oeste, especialmente no Golfo do México e na costa sul dos Estados Unidos. Tem o corpo achatado como um disco e nadadeiras modificadas que funcionam como “perninhas”, permitindo que caminhe sobre o fundo marinho.
Vivem nas profundezas dos oceanos Atlântico, Pacífico e Índico, na chamada zona abissal, onde a luz solar não chega e a pressão é extrema. Essa espécie se destaca pelo filamento luminoso extremamente longo, o mais comprido entre os peixes-lanterna conhecidos.
Fêmeas adultas vivem solitárias no fundo do mar, enquanto os machos passam a vida fundidos a elas, compartilhando o mesmo sistema circulatório.
Seu corpo é quase totalmente transparente, é possível ver os olhos e o trato digestivo através da pele. Raramente observado em vida livre, só foi filmado algumas vezes por submersíveis em expedições científicas. O polvo-de-vidro faz parte do grupo dos cefalópodes, animais inteligentes que incluem os polvos e as lulas.
Parte essencial das cadeias alimentares marinhas, como elo entre o fitoplâncton e os predadores maiores, contribui para o transporte de carbono nas camadas médias e profundas do oceano. Vive em mar aberto, flutuando livremente na coluna d’água do oceano Atlântico tropical. A distribuição das larvas mostra retenção próxima de certas formações oceânicas isoladas, sugerindo adaptabilidade à dispersão e aos fluxos oceânicos.
Além de animais que vivem no mar profundo e mal conhecemos, há ainda ecossistemas inteiros em meio a bolas de minério que são chamadas de nódulos polimetálicos que levaram milhões de anos para se formar no fundo do mar. Esses nódulos são o principal alvo da mineração em águas profundas, e retirá-los de lá pode causar distúrbios sem precedentes no equilíbrio do mar profundo e na saúde do oceano como um todo.
A mineração em águas profundas é a prática de extrair metais como manganês, cobre, cobalto e níquel diretamente do leito oceânico. Para isso, máquinas gigantes, que são maiores que uma baleia-azul, raspam o fundo do mar, sugam nódulos ou arrancam o solo e bombeiam o material para a superfície.
É uma indústria ainda praticamente inexistente, mas que tenta avançar rapidamente.
Alguns dos impactos possíveis:
A falta de dados exige precaução máxima. O próprio estudo citado alerta que, enquanto as mudanças climáticas já afetam áreas profundas do oceano, práticas como mineração no mar não devem avançar sem conhecimento científico adequado.
Empresas como a The Metals Company pressionam governos para abrir essa nova fronteira de exploração, ignorando evidências científicas e as consequências para o clima e a biodiversidade.
Essas companhias alegam que a mineração no fundo do mar é necessária para produzir baterias de veículos elétricos. Porém, a ciência aponta o contrário. Já temos produção de novas químicas de baterias sem cobalto e níquel, além da reciclagem e recuperação de metais que estão crescendo muito e reduzindo a demanda por novas minas.
Estamos diante de uma decisão histórica: podemos optar por proteger estes ecossistemas pouco conhecidos ou destruí-los antes mesmo de conhecê-los. A boa notícia é que a mobilização global cresce. Governos, cientistas e a sociedade civil pressionam por uma moratória global em águas internacionais e, no futuro, por uma proibição permanente.
Se pudéssemos voltar no tempo e impedir os primeiros poços de petróleo, o faríamos. Hoje, temos essa chance com a mineração no oceano profundo.
Junte-se a milhares de vozes que pedem pela proteção dos oceanos.
Este texto foi originalmente publicado pelo Greenpeace Brasil, de acordo com a licença CC BY-SA 4.0. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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