Mapa em alta resolução reforça necessidade de agricultura que estoque mais carbono no solo

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Por Júlio Bernardes – Jornal da USP | Acaba de ser disponibilizado para consulta o primeiro mapa global de solos em alta resolução, elaborado por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, reunindo colaborações de 50 cientistas de todo o mundo. O mapeamento revela o predomínio no planeta de solos arenosos, com pouca água e nutrientes, e que a agricultura intensiva reduz o estoque de carbono no solo, influenciando as emissões e as mudanças climáticas.

A partir do levantamento, os pesquisadores sugerem um maior uso de práticas de manejo sustentável para aumentar a fertilidade e a retenção de carbono nos solos. O mapa está publicado em uma plataforma digital de acesso aberto a todos os interessados e os resultados do mapeamento são apresentados em artigo da revista The Innovation.

“O estudo teve como objetivo elaborar o primeiro mapa global de solos em alta resolução, nesse caso, 90 metros, combinando observações de satélite, dados de campo e inteligência artificial”, afirma ao Jornal da USP o professor Raul Roberto Poppiel, um dos coordenadores do projeto. “A ideia foi identificar propriedades-chave dos solos em escala mundial e relacioná-las a fatores ambientais e socioeconômicos, permitindo avançar no conhecimento científico e oferecer subsídios para políticas públicas de uso sustentável da terra.”

O mapa usou dados coletados ao longo de seis anos, integrando milhares de amostras de solos georreferenciadas em diferentes países com informações de sensoriamento remoto. “Esses dados foram processados em modelos de machine learning [aprendizado de máquina], que permitiram estimar atributos do solo em áreas sem amostras diretas”, relata o professor da Esalq. “O resultado foi organizado em camadas digitais de fácil consulta através de uma plataforma digital.”

O mapeamento revelou que cerca de 64% da superfície terrestre é dominada por solos arenosos, que apresentam baixa capacidade de retenção de água e nutrientes. “Observou-se também que os solos agrícolas, em geral, possuem pH mais elevado, em média até 1,6 unidades acima do registrado em solos sob vegetação nativa, devido ao uso contínuo de corretivos e fertilizantes”, destaca Poppiel.

Estoque de carbono

“Os solos sob vegetação nativa concentram aproximadamente 54% do carbono orgânico global, enquanto os solos agrícolas apresentam, em média, 60% menos carbono. Esse contraste mostra como o uso agrícola intensivo reduz o estoque de carbono e, portanto, o potencial de mitigação das mudanças climáticas”, ressalta o professor. “Outro achado é que 75% do carbono armazenado em solos agrícolas está concentrado nas dez maiores economias do mundo, destacando a importância dessas regiões em estratégias globais de sequestro de carbono.”

De acordo com Poppiel, o estudo indica que práticas de manejo sustentável são essenciais para aumentar a fertilidade e recompor o estoque de carbono dos solos. “Entre as recomendações estão a adoção do plantio direto, o uso de culturas de cobertura, a adoção de sistemas agroflorestais e a redução do revolvimento do solo”, aponta. “Essas práticas ajudam a conservar matéria orgânica, melhorar a retenção de água e aumentar a resiliência dos sistemas agrícolas.”

O mapa global de solos em alta resolução foi disponibilizado numa plataforma digital de acesso aberto. “Ela permite que pesquisadores, formuladores de políticas e agricultores consultem e utilizem as informações para planejamento territorial e manejo sustentável”, finaliza o professor.

A pesquisa foi coordenada pelos professores José Alexandre Melo Demattê e Raul Roberto Poppiel do Departamento de Ciência do Solo da Esalq. O trabalho teve a participação de pesquisadores do Grupo de Geotecnologias em Ciência do Solo (GeoCiS) da Esalq, entre os quais Jean de Jesus Macedo Novais, Nicolas Augusto Rosin, Jorge Tadeu Fim Rosas, Merilyn Taynara Accorsi Amorim, Letícia Guadagnin Vogel, Rodnei Rizzo e Danilo Cesar Mello.

Práticas de manejo sustentável são essenciais para aumentar a fertilidade e recompor o estoque de carbono dos solos, entre elas o plantio direto, culturas de cobertura, uso de sistemas agroflorestais e redução do revolvimento do solo – Gráfico retirado do artigo

Também colaboraram os professores Quirijn de Jong van Lier, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, em Piracicaba, e Márcio Rocha Francelino, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), além de uma ampla rede internacional com mais de 50 cientistas. 

O estudo contou com o apoio de instituições parceiras e de iniciativas estratégicas, como o Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical da USP (CCarbon/USP), sediado na Esalq.

O artigo Frontiers in earth observation for global soil properties assessment linked to environmental and socio-economic factors está disponível neste link.

Mais informações: raulpoppiel@usp.br, com o professor Raul Roberto Poppiel

Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da USP, de acordo com a licença CC BY-SA 4.0. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.

Bruna Chicano

Cientista ambiental, vegana, mãe da Amora e da Nina. Adora caminhar sem pressa e subir montanhas.

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