Brasil depende da água e da comida produzida no Cerrado, alerta cientista

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Por Lucas Guaraldo – IPAM | A preservação do Cerrado vai além do controle das emissões de gases de efeito estufa causadas pelo desmatamento e exige atenção para o papel do bioma na produção de água, alimentos e outros serviços ecossistêmicos, alerta Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). A cientista participou neste sábado, 13, da apresentação “Sem Cerrado, não há clima: o que levamos à COP 30”, realizada durante o 11° Encontro dos Povos do Cerrado, em Brasília.

“O desmatamento do Cerrado vai além do carbono. Precisamos situar o bioma no contexto nacional e compreender que a população brasileira depende da água e da comida que são produzidas nele. Por isso, é fundamental discutir o Cerrado como uma entidade ecossistêmica cuja preservação tem valor imenso para o Brasil, mesmo que as emissões da Amazônia sejam maiores”, destacou Ane.

A menos de três meses da COP 30, que promete trazer Belém e Amazônia para o centro do debate climático mundial, o Cerrado ainda sofre com o avanço do desmatamento. Apesar de sua relevância para o Brasil e para a biodiversidade global, o bioma permanece sub-representado nas políticas nacionais e na agenda climática internacional.

“Espero que a gente consiga mostrar na COP que a sociedade quer algo diferente. Acho que essa é a mensagem mais poderosa de Belém. Temos que nos preparar como pessoas do Cerrado, como pessoas da savana, para que isso aconteça. Precisamos trabalhar bem a mensagem de que o bioma é fundamental para o Brasil”, completou Alencar.

Desde 1985, segundo dados da Rede MapBiomas, da qual o IPAM faz parte, o Cerrado perdeu 40 milhões de hectares de vegetação nativa, tornando-se um dos principais vetores das emissões brasileiras de gases de efeito estufa. As áreas rurais privadas concentraram 72% de todo o desmatamento do bioma no período, que já acumula mais de 14 milhões de hectares de pastagens degradadas, um indicativo do uso pouco eficiente da terra.

No mesmo período, quase metade do bioma foi queimado ao menos uma vez, superando a marca de 89 milhões de hectares atingidos pelo fogo. Apenas em 2024, mais de 9,7 milhões de hectares foram queimados, uma área superior à do Estado de Santa Catarina. Já em 2025, mesmo no início do período mais intenso de incêndios, o fogo já havia alcançado 1,2 milhão de hectares. Os dados do MapBiomas também indicam que o uso recorrente do fogo é responsável por 58% da área queimada em propriedades privadas.

Povos e comunidades

Outro ponto de atenção para a COP, alertaram os participantes da mesa, é garantir que os povos e comunidades sejam ouvidos e incluídos nas tomadas de decisão que afetam diretamente seus territórios. Para Samuel Caetano, coordenador técnico do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas e integrante da Rede Cerrados, o respeito aos direitos das comunidades é o primeiro passo para qualquer decisão ambiental.

“Como promover a mitigação e a adaptação climática sem demarcar territórios? Como falar de justiça climática sem falar de justiça territorial? O que precisamos levar desta COP, e que pode ser o nosso grande legado, é a conexão dos povos da savana. Esse será o nosso saldo positivo. Precisamos estar unidos para não sermos abandonados nas mesas de discussão”, destacou.

Com a aceleração do desmatamento no Cerrado, territórios indígenas e quilombolas têm sido cada vez mais afetados pela grilagem e pela invasão de terras, além de conflitos relacionados ao acesso à água e ao garimpo. Em 2024, áreas protegidas do bioma perderam 26,97 mil hectares de vegetação nativa devido ao desmatamento, segundo dados do Relatório Anual do Desmatamento.

Bruna Chicano

Cientista ambiental, vegana, mãe da Amora e da Nina. Adora caminhar sem pressa e subir montanhas.

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