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Narcisismo é um comportamento que se manifesta individual e coletivamente, trazendo consequências socioambientais

Narcisismo, no dicionário de português, significa amor próprio. Inspirado no mito de Narciso, da mitologia grega, o termo foi usado em 1899 por P. Näcke para descrever a conduta em que o indivíduo trata o próprio corpo como se este fosse o de um objeto sexual. Mais tarde, ele foi adotado pela psiquiatria sendo utilizado para descrever o Transtorno de Personalidade Narcisista (TPN), um transtorno de personalidade catalogado no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV. Na psicanálise clássica de Freud, o narcisismo descreve a estrutura psíquica de um indivíduo cujo ego se estrutura a partir de si mesmo como objeto da pulsão.

O narcisismo pode ser abordado tanto do ponto de vista do indivíduo, sendo considerado um transtorno, quanto da cultura como um todo. No segundo caso, ele é visto como uma consequência da sociedade de consumo. Nela, a imagem do indivíduo, associada ao que ele consome, é objeto de espetáculo. A espetacularização do consumo baseada na imagem é um comportamento cultural. Ele se manifesta globalmente e traz consigo consequências ambientais.

Narcisismo e o mito de Narciso

Imagem editada e redimensionada de Milkoví, está sob domínio público

O mito de Narciso, que inspirou o termo “narcisismo“, conta a história do filho de Cefiso e Liríope, o bebê mais lindo do mundo, Narciso. Sua mãe, preocupada com o excesso de beleza do filho, consulta Tirésias – um cego que tinha o dom de prever o futuro como forma de compensar a perda de sua visão – e ele lhe diz que Narciso poderia viver muito bem, com a condição de que jamais pudesse ver a si mesmo.

A mãe de Narciso, preocupada e crendo no que lhe disse Tirésias, manda quebrar todos os espelhos da casa e faz de tudo para que seu filho cresça sem jamais ver a si próprio. Mas, um dia, Narciso escapa dos seus cuidados e, em um lindo bosque, resolve beber a água de um lago. Assim que se debruça, fica surpreso com o que vê: a própria imagem. “Que lindo! Que perfeito!”, pensa ele. E, desde então, ficou paralisado: não comia, não bebia, estava apaixonado por si mesmo. Depois disso, Narciso nunca mais foi visto e os deuses o transformaram em uma bela flor amarela e branca.

A excessiva importância dada à imagem de si mesmo é a principal característica de Narciso. A valorização da imagem é a base para a ideia do narcisismo – termo utilizado em diversas áreas do conhecimento.

Narcisismo na psicanálise

Sigmund Freud, neurologista criador da psicanálise, introduziu o conceito de “narcisismo” em seu ensaio Sobre o narcisismo (Zur einführung des narzißmus, em alemão). Nele, Freud explora aspectos inconscientes da mente e cita Paul Nacke, a primeira pessoa a usar o termo em um estudo sobre perversões sexuais.

Freud diz que Paul Nacke escolheu o termo narcisismo para descrever “a atitude de uma pessoa que trata seu próprio corpo da mesma forma pela qual o corpo de um objeto sexual é comumente tratado” – e acrescenta que todos têm algum nível de narcisismo em seu desenvolvimento. Mas ele complementa a análise de Paul Nacke e diferencia tipos de pessoas narcisistas.

No narcisismo primário, crianças e jovens acreditam ser superiores e investem toda sua libido em si mesmas. Entretanto, com o passar do tempo, essa libido é dirigida para fora, para outros objetos que não o próprio indivíduo. No narcisismo secundário, após a libido ser projetada para fora, os indivíduos a direcionam de volta para si. Isso resulta em adultos deslocados da sociedade, que não possuem capacidade de amar e serem amados.

O narcisismo exige uma intensa autopreservação da imagem (no sentido do que o indivíduo representa para si, não necessariamente fisicamente). A mínima ameaça à autoimagem idealizada se torna motivo de vergonha, culpa e de atitudes defensivas.

Consumo, narcisismo e meio ambiente

Imagem de Viktor Theo em Unsplash

O modelo socioeconômico vigente tem como um dos elementos de sua manutenção uma sociedade marcada pelo consumismo, em que o individual prevalece sobre as causas coletivas. A centralidade no indivíduo, que se baseia na autorrealização a partir do consumo, despreza as relações e os ideais coletivos; e faz com que o ser foque em sua própria vantagem, mantendo contato com o outro apenas como instrumento de confirmação do próprio eu. Nesse cenário, não há troca real de interesse pelo outro.

Dessa maneira, o consumo tem criado uma sociedade culturalmente narcisista. Entretanto, apesar do narcisismo cultural se manifestar na fase adulta, ele não se caracteriza como um narcisismo secundário, e sim como uma regressão ao narcisismo primário, à fase infantojuvenil.

O indivíduo que depende do consumo para se autorrealizar, além de ansioso, inseguro e infeliz, é alienado. Ao recorrer à compra para suprir a carência afetiva, devido ao medo do abandono e do vazio, acaba por se afastar da relação com as pessoas e com o meio em que vive.

Nesse sentido, as causas ambientais, que podem ser entendidas como causas coletivas, são causas desprezadas pela sociedade do narcisismo cultural. Os direitos animais e impactos sociais de origem ambiental são, na maioria das vezes, levados em conta apenas quando trazem retorno financeiro ou quando se manifestam como uma forma de confirmação do eu. É por isso que o narcisismo cultural é uma das engrenagens do motor do consumismo e, consequentemente, um potencializador da devastação ambiental.


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